Ainda não foi dessa vez que vimos Godzilla ser bem retratado no cinemas, se o filme do Roland Emmerinch falhou em representar a criatura em seu aspecto físico este novo filme do Gareth Edwards falha em representá-lo em seu aspecto metafórico.
E lembrando os desavisados críticos do filme de 98 do Emmerinch, se ele não representou o Godzilla dignamente em seu filme saiba que os japoneses já fizera coisas muito piores com ele, tem uma era de filmes de Godzilla denominada era Showa, nessa era os filmes de Godzilla eram voltados para o público infantil, então nessas produções víamos um "Barneyzila", um monstro protetor da terra que vivia com os seus miguxos na ilha dos monstros, Godzilla e os demais falavam inclusive, eram amigos dos humanos também, e lutavam contra monstros em sua maioria vindos do espaço, mandados por aliens que queriam dominar a terra, tosco ao extremo, e made in japan.
Agora que já situamos bem as coisas vocês vão entender o que digo sobre esse novo filme deturpar completamente o conceito original do Godzilla japonês (aquele de 1954), neste novo filme de Godzilla ele é apresentado como um
"Deus protetor do equilíbrio", que está dormindo no interior do planeta, abaixo do limites do fundo do mar, como ele seus inimigos também faziam o mesmo, os mutos ficavam embaixo da terra absorvendo a radiação do planeta para se alimentar, mas ai um acidente faz com que um deles saia do subterrâneo e venha se alimentar de radiação na superfície, depois disso vem o outro, dois monstros que se alimentam de radiação vem para destruir tudo o que vem pela frente para se alimentar de radiação, com isso botando em risco toda a humanidade,
esse é o mesmíssimo conceito do Godzilla de 54, tirando o fato de que nesse filme o Godzilla é criado graças ao efeito das bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki ao que tudo indica,
mas os mutos já existiam bem antes da confecção de armamento nuclear, só nisso eles se diferem.
Vimos que os Mutos tem praticamente o mesmo conceito do Godzilla original, mas e o Godzilla?
Bem, como falei o Godzilla nesse filme é um
"protetor do equilíbrio", um ser usado pela natureza para promover o reajustamento do mundo depois da chegada e desequilíbrio gerados pelos Mutos, um herói dos humanos por consequência, pois mesmo colocado de uma forma meio sem querer ele salva a pele dos humanos inúmeras vezes no filme,
o que quero dizer é que esse Godzilla nada tem haver com o conceito original da criatura, os Mutos estão muito mais engajados no conceito original do Godzilla que o próprio, o Godzilla nunca foi esse
protetor do equilíbrio
, isso ficava a cargo da Mothra e outros monstros na filmografia japonesa, o Godzilla nunca foi herói (salvo na era showa lixosa), ele no máximo era um anti herói de ocasião em filmes onde enfrentava outros monstros, aparecia um monstro que a principio parecia ser uma perigo mais emergencial que o próprio Godzilla, então o Godzilla ia enfrentar esse monstro pra garantir a sua sobrevivência e território, e por consequência salvar os humanos temporariamente do tal novo inimigo, ele nunca foi esse
paz e amor que é nesse novo filme, nunca derrotou os seus adversários pra salvar o rabo dos humanos e proteger equilíbrio nenhum.
O Godzilla sempre foi um agente do caos para os humanos, que vinha dos oceanos para terra firme a fim de destruir as cidades e matar os seres humanos em busca de alimento, a radiação, ele era uma alusão a bomba atômica, um subproduto dos seus malefícios, uma criatura que vinha cobrar os seres humanos pelos seus pecados do uso da energia atômica, é isso que ele é, tanto é que nos filmes onde ele não luta com outros monstros ele é inimigo da humanidade, no filme de 1954 e no The return of Godzilla de 1985, é ele contra os humanos, e mesmo nos filmes onde ele enfrenta outros monstros se nota que ele é inimigo também, depois de destruir o monstro "inimigo" ele próprio trata de destruir o que sobrou das cidades após o combate (Godzilla 2000), isso quando não são outros monstros a serem os heróis que impedem o Godzilla de destruir o Japão, Godzilla, Mothra and King Ghidorah: Giant Monsters All-Out Attack, Godzilla vs King Ghidorah, Godzilla vs Mothra, Godzilla vs Biollante e etc).
Esse conceito de anti herói de ocasião é muito melhor pro Godzilla que esse de
herói protetor do equilíbrio
do filme do Gareth Edwards, nesse conceito dos filmes japoneses o Godzilla pode representar ao mesmo tempo o que existe de melhor e pior pra humanidade, uma hora ele faz bem, outra hora ele faz mal, com isso ele representa um mal necessário pra humanidade no fim das contas,um conceito muito mais complexo e multifacetado que nesse novo filme.
Esse novo filme assim como os japoneses deveria ser uma batalha do mal contra o mal, de monstros que vão destruir a humanidade quando um destes se consagrar vencedor do embate, deveria ser como no slogan de Alien vs Predador, quem quer que ganhe nós perdemos.
Mas não é isso que vemos,
após derrotar os Mutos e cair desmaiado de cansaço o Godzilla acorda em meio ao que restou da cidade, com humanos em volta o olhando ressabiados, e então tudo que o Godzilla faz é se levantar, dar uma olhada em volta e sair calmamente em direção ao oceano, sem destruir nada, sem fazer mal a ninguém, nem agora nem antes, pois ele se contentou em ficar em baixo da terra absorvendo pequenas doses de radiação pra manter o minimo de funções vitais, porque sair pra se alimentar iria incomodar os humanozinhos e acabar com o equilíbrio,
pura besteira.
Sem contar que ele mal aparece no filme, quase duas horas de filme pro Godzilla aparecer no máximo 11 minutos, sem contar também o drama humano, que se sustenta muito bem até a primeira meia hora de filme, mas quando o bastão do protagonismo passa de mãos a coisa desanda e vira um dramalhão asséptico, protagonizado por um herói militar puramente sem sal, pelo menos a trilha sonora e a construção do suspense até o aparecimento do Godzilla são muito bem feitos, mas é só.
Aos que tiveram a enorme paciência pra ler essa bíblia eu agradeço, mas essa crítica e do tamanho da minha indignação, enorme.