A despretensão é a nova pretensão
por Bruno CarmeloO cinema argentino é conhecido por ter desenvolvido um nicho comercial que falta às produções brasileiras: os filmes "médios" – nem grandes blockbusters populares, nem pequenos filmes de arte. São obras com temas comuns, urbanos, contemporâneos (família, amores etc.), de produção pouco onerosa e, portanto, com boas possibilidades de se tornar rentáveis.
Entretanto, essa busca pela máxima simplicidade possível, pelo elogio à banalidade, às vezes gera algumas obras de baixas pretensões artísticas e narrativas. Este foi o caso, recentemente, de Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Virtual, Juntos para Sempre e deste Amor em Trânsito, no caso argentino, ou ainda de 18 Comidas na Espanha e Bonsai no Chile. São filmes de cineastas jovens, sobre personagens igualmente jovens, belos, brancos, de classe média. Eles são elétrons livres na cidade, transitando pelo espaço sem pertencerem à sociedade ou à família, a uma empresa, uma igreja, um clube. Só o que importa em suas histórias são eles mesmos, suas crises existenciais, suas possibilidades de amores. Há algo manifestamente egocêntrico e pós-moderno nestas representações.
O grande problema é que falta contexto para que os personagens ganhem um mínimo de complexidade. Ninguém parece ter uma opinião política, um passatempo, uma comida preferida, uma mania, um temperamento específico, uma singularidade qualquer. Eles são superficiais, perfeitamente intercambiáveis, como se existissem apenas na duração de cada cena. Seus conflitos não são afetados por acontecimentos anteriores ou posteriores, nem pelo espaço. Reina o tempo presente, em sua absoluta e voluntária trivialidade. O orçamento limitado, a filmagem em digital e a câmera excessivamente tremida contribuem para a aparência de um despojamento calculado.
Amor em Trânsito cruza a história de quatro pessoas: dois homens, duas mulheres. Sabe-se, pelos cartazes e pelo próprio projeto, que eles vão se amar, se cruzar, se separar. Todos os elementos que compõem o gênero independente estão presentes: a música lúdica e onipresente, os personagens "alternativos", que interrompem as falas uns dos outros com tiradas maliciosas e referências pop, as vinhetas animadas na introdução, o recito em aberto com conclusão circular (o fim retoma o começo), com direito a uma narração pseudo filosófica sobre o ato de se encontrar e se perder. Fala-se em viagem, mas não se vê ninguém de fato viajando. Nunca uma comédia sobre o deslocamento foi tão estanque.
Pode-se argumentar que os atores são bons, mas o talento do elenco é o pouco explorado pelas situações simplistas. Reina um eterno sentimento alegre, otimista, tranquilo, mas ao mesmo tempo uma aparência morna. Talvez a história seja satisfatória para quem simplesmente quiser passar o tempo, mas um tanto insossa para quem procura um filme singular. Após assistir a Amor em Trânsito, fica a vontade de ver estes jovens diretores, como Lucas Blanco, arriscar e correr o risco de errar, ao invés de criar uma obra segura, mas idêntica a dezenas de outras por aí, e que será esquecida logo após a projeção.