Uma estrela em ascensão
por Lucas SalgadoInverno da Alma talvez seja o grande monólogo cinematográfico de 2010. É claro que é injusto com os coadjuvantes do filmes falar algo deste tipo, em especial com o ótimo John Hawkes (indicado ao Oscar pelo papel), mas é impossível negar que a bela Jennifer Lawrence (que já havia roubado a cena de Charlize Theron em Vidas que se Cruzam) é o principal trunfo da produção.
A jovem atriz de apenas 20 anos, que também foi lembrada pelo prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, é o grande nome do filme, para o qual teve que aprender coisas como lutar, cortar lenha e, até mesmo, dissecar um esquilo.
Lawrence dá vida à Ree Dolly, uma garota de 17 anos que tem que encontrar seu pai. Envolvido com o mundo das drogas, o sujeito usou a casa de sua família como forma de garantir sua liberdade condicional e se não comparecer à uma audiência perderá a propriedade.
Com um casal de irmãos mais novos e uma mãe doente, Ree não pode se dar o luxo de esperar o tempo passar e fará de tudo para encontrar seu pai, até mesmo buscar respostas de pessoas perigosas e nada sociáveis.
O desempenho da atriz lembra um pouco o de Melissa Leo em Rio Congelado no sentido de que as duas oferecem atuações marcantes tendo como coadjuvante principal o ambiente frio e vazio. A vantagem para Lawrence é que sua interpretação promete ficar mais tempo na memória do espectador do que a de Melissa, até porque Inverno da Alma é muito mais completo como filme.
Como destacado, o cenário gelado é parte importante da trama e ajuda a compreender não só a dificuldade financeira vivida pelos personagens, mas também suas personalidades tensas e nada amigáveis. O frio também contribui com a narrativa na construção de um ambiente opressor, que por sua vez cairá sobre a personagem principal.
Quem prestar atenção apenas na sinopse pode achar que o filme é sobre a jornada de uma filha à procura de seu pai, mas é muito mais do que isso. Ree embarca, na verdade, em uma jornada sem volta de autoconhecimento. A jovem terá que colocar seus sonhos de lado para assumir a função de chefe de família, tudo isso com apenas 17 anos. O tio Teardrop (Hawkes) é o único que tentará ajudá-la, apesar de contar com uma série de problemas próprios.
Indicado ao Oscar de melhor filme e grande vencedor do Festival de Sundance em 2010, Winter's Bone (no original) é o trabalho mais consistente da diretora e roteirista Debra Granik (Down to the Bone) e mostra a força da produção independente norte-americana. Produtora do longa, Anne Rosellini também é coautora do roteiro.
A boa trilha sonora composta por Dickon Hinchliffe, unida com canções country como "The Missouri Waltz" - que abre o longa -, ajuda na construção de um ambiente interiorano, o que dá ao filme quase que um caráter de atemporalidade. Obviamente, trata-se de um filme contemporâneo, até por trazer elementos modernos (como carros novos), mas o interessante é notar que a essência não está ligada ao mundo moderno ou às atividades urbanas da atualidade.
Inverno da Alma marca a estreia de Rebecca Hofherr como figurinista principal após vários anos trabalhando como assistente de nomes como Amy Westcott (Cisne Negro) e Michael Wilkinson (Watchmen - O Filme). E acho seguro dizer que ela já pode andar com as próprias pernas.
A qualidade técnica da produção vai muito além da trilha e do figurino, passando também pela ótima fotografia de Michael McDonough e a competente edição de Affonso Gonçalves.
Não deixe de conferir Inverno da Alma, um filme belo e ao mesmo tempo angustiante, e que ainda oferece uma das maiores performances individuais dos últimos anos. Jennifer Lawrence é uma atriz em ascensão e que deve ser observada de perto.