UMA LIÇÃO DE VIDA OU MORTE
por Roberto CunhaSe você faz parte do time que não gosta de filmes "baseado em fatos reais", é bom saber neste minuto que 127 Horas é um deles. Porém, diferente da maioria que costuma virar dramalhão e ter muitos personagens, este longa tem um diferencial e tanto: é a história de um homem só. Literalmente. Em maio de 2003, Aron Ralston trilhava uma aventura pelos canyons de Utah, nos Estados Unidos, e acabou ficando com seu braço preso por uma pedra após uma queda dentro de uma fenda. Sozinho e isolado do mundo, sua luta pela sobrevivência foi relatada em um livro e durou o tempo que batiza esta produção.
Com belas sequências iniciais, o diretor Danny Boyle (Quem Quer Ser um Milionário?) apresenta o universo do protagonista de maneira brilhante, sonora e colorida. Mas o drama só começa com o silêncio total, após o acidente, quando o espectador cai junto com Ralston (James Franco) na mais absoluta certeza de que algo deu muito errado. E o cineasta bate o pino de misericórdia quando o som retorna e um providencial afastamento da câmera picada (filmada do alto) em direção ao céu, revela o inferno em que o alpinista se meteu. O pior ainda vai acontecer. Como era de se esperar, as cenas seguintes terão um rotina agoniante. Contudo, o roteiro preferiu não ir pelo caminho conhecido e procurou vias alternativas para acentuar o "aprendizado" do protagonista que, apesar do bom humor constante, se relacionava mal com as pessoas. Assim, entre a administração da pouca água potável e as tentativas em vão de se soltar do local, memórias e delírios se misturam, revelando arrependimentos (típico de quem vive uma situação limite) de um cara egoísta e duro na queda.
Deixando de lado o merchandising acintoso de marcas como Cannon, Suunto, Petzel e Gatorade, entre outras, a crítica verbalizada ao que é produzido na China faz pensar em como faz falta um bom e util Victorinox. Do elenco diminuto e de rápidas passagens, a curiosidade vai para a pequena participação de Treat Williams, velho conhecido dos fãs do clássico Hair. O mérito de 127 Horas foi equilibrar este mosaico de informações numa contagem regressiva de pouco mais de 90 minutos. E aviso aos aventureiros: engana-se quem pensa que vai ver só sangue, suor e lágrimas. Embora existam (algumas) cenas de forte impacto, o destaque mesmo vai para aquelas sequências minuciosas onde o som tem relevo e imagens raras falam mais alto. É o que acontece na hora do raio de sol com seu belo significado, nos momentos "internos" da garrafa, no cabeçote da câmera e até no primeiro - e significativo - registro de um vizinho local: uma simples formiga.
Portanto, assim como a vítima conclui que em alguns momentos de nossa existência “tudo vem de uma vez”, o que se constata ao encarar esta experiência de alta tensão é que ela foi para ele, e para todos que a conhecem, uma verdadeira lição de vida ou morte.