Quem Sou Eu?
por Francisco RussoA identidade talvez seja o bem mais precioso do homem. Quem somos, do que gostamos ou odiamos, quais foram nossas experiências passadas... questões que definem a individualidade de cada um. Tire tais informações e o resultado será uma pessoa oca, sem nada a contar e pouco a oferecer. É o que acontece com Martin Harris, vivido com competência por Liam Neeson em Desconhecido. Uma pessoa perdida, em uma cidade estranha e rodeado por gente esquisita, que se apega a memórias nas quais não deve acreditar tanto assim.
Desconhecido é um filme de mistério, no melhor estilo Alfred Hitchcock. Um homem chega com sua esposa a Berlim, com o objetivo de participar de uma conferência de biotecnologia. Esquece a mala no aeroporto, deixa a esposa acertando os trâmites da entrada no hotel e volta para buscá-la. No caminho, seu táxi sofre um acidente e ele vai parar em pleno rio. Quatro dias depois, desperta no hospital. Ao voltar para sua esposa, surpresa! Ela não o reconhece e outro homem assumiu seu lugar. Na internet, todos os dados apontam para o substituto. Afinal de contas, quem sou eu?
A dúvida é a mola mestra do longa-metragem, apesar de ser explorada de forma a facilitar a compreensão do público. Em poucos momentos Martin Harris é realmente questionado, no sentido de fazer com que o espectador duvide que esteja falando a verdade. Diante de tal cenário, a opção da loucura ou trauma de memória é válida. Quando o filme aparenta rumar neste sentido, abrindo um leque bastante interessante dentro da história, eis que surge o vilão para mostrar a todos que há realmente algo de correto no que este homem diz. Mais óbvio, impossível.
Com o público informado de que Harris é realmente o "herói" do filme, tudo flui de forma natural e sem sobressaltos. Há a busca pela verdade diante da perseguição sofrida, com as inevitáveis participações ocasionais. A melhor delas é de Bruno Ganz, como um ex-agente da Stasi, a polícia secreta da Alemanha Oriental. Diane Kruger é a mocinha da vez, desconfiada de início mas depois até mesmo convidando Harris a ficar em sua casa, quando não há motivo para tanto. Incoerência na construção da personagem? Talvez. Uma atitude exagerada diante da situação apresentada, mas necessária pelo que o filme se propõe a ser: um mero suspense de ação que faça com que o público se "surpreenda" com o desenlace do mistério sem que, no meio do caminho, questione o caminho a ser percorrido rumo à resolução definitiva.
Com boas cenas de perseguição de carro e uma tensa luta final, Desconhecido é um filme bem feito que serve também para estabelecer Liam Neeson como astro de filmes de ação. Interessante pela justificativa dada para resolver o mistério, apesar dela lembrar muito um filme recente estrelado por Matt Damon, mas banal na condução da própria história. Falta ao filme estabelecer na mente do espectador a dúvida necessária ao bom suspense, de forma a instigar o raciocínio para compreender o que, de fato, está acontecendo. A opção em entregar tudo mastigado pode ser a mais fácil e palatável, mas também o torna um filme menor. Regular apenas.