Muito bom filme.
Trata-se de um drama erótico, aliás, pra quem não sabe, ou não viu.
O nome já é bastante sugestivo: ``Ultimo tango em Paris´´, por ser tango uma dança complexa, bonita e com ar de tragédia e Paris, a cidade dos apaixonados.
Logo no começo do filme os personagens principais, com um ar de melancolia, vagam na ruas quase como pessoas perdidas, em busca de alguma coisa.
Fazem sexo, em pouco tempo depois, em um apartamento vazio e sujo, sem se conhecer, sem saber nomes, tendo trocado algumas palavras.
Aliás tem sexo no filme e cenas de nudez, tendo gerado muita polêmica na época, mas não é sexo por sexo, sem necessidade, como a gente tá se acostumando em ver
cada vez mais nos filmes, livros e até em novelas ( pra quem gosta e assiste novela ). É sexo fundamental para a construção da estória e dos personagens.
Uma estória que ao meu ver fala do eterno conflito que os seres humanos enfrentam entre fazer aquilo que gostam e que
aquilo que a sociedade espera que eles façam.
Fala de como as pessoas usam umas as outras pra curar suas carências, dores, e frustrações e esperam que os outros atendam as suas expectativas.
De como carregamos fatalmente para relacionamentos novos os vícios e traumas de relacionamentos anteriores.
Ela, é uma personagem que busca por liberdade, que procura por coisas novas, isso não é dito mas fica subentendido uma vez que trata-se de uma atriz de 20 anos e os artistas e jovens em geral carregam esse esteriótipo.
Aliás isso fica claro também no fato de tanto ela Jeannie ( Maria Schneider ), quanto ele ( Marlon Brando ) estarem procurando por um apartamento pra alugar,mesmo já tendo suas casas para morar.
Enfim ela encontra em Paul, uma nova proposta de vida. Que é a de sexo sem compromisso, sem cobrança, sem obrigação, só por desejo.
Jeannie pode parecer submissa equivocadamente em algumas partes da trama, mas não o é.
Ela não é levada a fazer coisas que não deseja, muito pelo contrário, aquilo tudo é exatamente o que ela está buscando.
Tanto que no final ele se apaixona por ela, e está disposto a manter um relacionamento convencional, que afinal de constas já deveria ser o tipo de relacionamento que ele mantinha com a sua falecida esposa, ao passo que Jeannie sim, se mantêm atraída pela ideia de liberdade.
Paul tenta infringir sofrimento a Jeannie, apenas como forma de extravasar a dor infringida a ele pela esposa infiel, e isso fica claro na cena em que ele faz sexo anal com ela no chão ( uma das mais polêmicas do filme ) enquanto a força a falar frases sobre família: ``Vou falar-lhe de segredos de família,
essa sagrada instituição que pretende incutir virtude em selvagens. Repita o que vou dizer: sagrada família, teto de bons cidadãos.
Diga! As crianças são torturadas até mentirem. A vontade é esmagada pela repressão. A liberdade é assassinada pelo egoísmo. Família, porra de família!"
Ele quer deixar registrado a sua decepção com o conceito de fam´lia, com a hipocrisia em torno do correto e do incorreto.
Jeannie se sente visivelmente culpada por ter prazer em uma relação fora dos padrões da sociedade ela diz pra si mesma que não pode levar aquilo adiante,
que não pode continuar naquele relacionamento sem futuro, transando em uma cama, onde passa ratos com um cara que não quer saber se quer seu nome e ela vive um relacionamento
paralelo, com um cineasta da sua idade, demonstrando uma questão de dualidade, de conflito.
Ao passo que Paul propõe um relacionamento sem passado, sem futuro, sem nomes, o outro propõe casamento. Ao passo que Paul é completamente descrente em relação à família e principalmente às mulheres, por já ter sido traído por uma inclusive, Tom ( seu outro par ), é apaixonado pela arte, pela vida. Um outro traço que fica caracterizado da personalidade dele, é que ele é um pouco bitolado, pois o filme que ele está filmando no momento parece ser a única meta dele, ele não tem outro assunto, outra preocupação, mostrando-se um personagem romântico ( estilo ), as vezes chato e deslumbrado.
Quando Jeannie percebe que perdeu Paul, pois ela vai ao apartamento onde eles se encontravam habitualmente e o mesmo está completamente vazio, ela liga para
o seu namorado e diz ter encontrado por acaso um apartamento para eles morarem, mas na realidade o que ela está propondo pra ele é um estilo de vida. Ela quer viver com ele, da forma que vivia com Paul.
Quando Tom entra no apartamento ele gosta a princípio, eles brincam como crianças, se divertem, mas em seguida ele pára e diz que é preciso que eles ajam como adultos, que eles não podem agir feito crianças e que aquele apartamento não é pra eles, ``é muito grande, que dá pra se perder lá dentro,´´ ou seja, está fora dos padrões,não traz a segurança que o convencional traz.
Deste modo fica claro que o apartamento em toda trama é algo simbólico, representa fuga para Paul, instabilidade para Tom e liberdade / novidade para Jeannie.
Tom diz que vai procurar outro apartamento pra eles e se despede de Jeannie informalmente, com um aperto de mãos, o que dá uma conotação de que eles são estranhos. É como se naquela hora ele estivesse a conhecendo de fato.
Fica claro também ( se antes era só de forma subliminar ) que Tom também não ama Jeannie.
Enfim, quando Paul se declara a Jeannie que está apaixonado por ela, conta seu nome, idade, história de vida e propõe um relacionamento convencional ela simplesmente fica desapontada e resolve terminar tudo, comprovando que a paixão dela era pela ideia de liberdade, pela proposta diferente e não por Paul.
É quando ocorre uma tragédia.
É um filme que aborda temas já conhecidos com uma linguagem nova, tendo servido de inspiração e modelo pra muitos outros.
A maneira como a trilha, os locais, o sexo contribuem para o enredo é genial.
Vale a pena assistir.