Manoel Garrincha dos Santos foi um dos maiores jogadores de futebol brasileiro. Junto com Pelé, Nilton Santos, Didi e Gilmar foi um dos representantes de uma época áurea do futebol nacional. Esses e outros jogadores formaram uma seleção dos sonhos, que conquistou dois títulos mundiais para o Brasil (em 1958, na Suécia; e em 1962, no Chile). A cinebiografia “Garrincha – Estrela Solitária”, filme baseado no livro homônimo de Ruy Castro, conta a história deste “demônio das pernas tortas”, do homem que teve uma vida alegre e um fim triste.
A história de Garrincha (interpretado no filme por André Gonçalves) é igual a de muitos outros jogadores. Ele nasceu em Pau Grande, uma cidade do interior do Rio de Janeiro, e possuía uma origem humilde. Entretanto, ele foi agraciado com um grande dom: o de jogar futebol. Garrincha se divertia jogando pelada com os amigos, bebendo e colecionando namoradas. Foi numa das peladas de rua que ele foi descoberto por um olheiro, que o convidou para fazer um teste no Botafogo. O time logo reconheceu o valor de Garrincha e não o deixou sair de lá sem assinar um contrato (em branco! – prática que, naquela época, era perfeitamente normal). O resto da história todo mundo já conhece.
“Garrincha – Estrela Solitária”, no entanto, começa no período de maior decadência do ídolo, quando, no carnaval de 1980, já acabado pelos efeitos do álcool, recebeu uma homenagem da Estação Primeira de Mangueira. Na ocasião, Garrincha mal se agüentava em pé e parecia estar em transe. Os 90 minutos de desfile são, literalmente, uma hora e meia de agonia e humilhação. No decorrer do desfile conheceremos as quatro pessoas que nos apresentarão a história pessoal e profissional de Garrincha.
O primeiro ponto de vista nos é oferecido por Iraci, a ex-namorada que virou amante do craque. Explico: Iraci era a namorada de Garrincha, quando ele engravidou outra e teve que se casar com ela. Quando Garrincha assinou contrato com o Botafogo, foi Iraci quem foi viver com ele no Rio de Janeiro, sendo a sua mulher. No entanto, Garrincha nunca assumiu Iraci publicamente e ela se contentava com isso e com as conquistas amorosas do jogador. Até o dia em que ele conheceu o grande amor de sua vida: a cantora Elza Soares (Taís Araújo) – a segunda pessoa que nos apresentará quem é Garrincha.
Elza e Garrincha se conheceram no Rio de Janeiro, mas se aproximaram durante a Copa do Mundo de 1962, no Chile; quando ela viajou ao país para representar o Brasil num festival de música. O amor entre os dois era impulsivo e apaixonado. Por Garrincha ter “abandonado” a esposa para ficar com ela, Elza sofreu com as acusações de ser uma destruidora de lares e de controlar o próprio Garrincha. Ela era odiada por todos, inclusive pelos amigos do jogador. Com Elza, Garrincha experimentou a felicidade plena, bem como a tristeza profunda (por causa da controvérsia em torno deles, os dois tiveram que se mudar para a Itália e Garrincha teve que abandonar os campos, se afundando de vez na bebida). Elza lutou muito por Garrincha e para que ele abandonasse o álcool. Tudo foi em vão e ela alcançou o seu limite, o abandonando.
Os últimos pontos de vista sobre o jogador vêm daqueles que acompanharam a sua trajetória profissional. Sandro Moreyra, um jornalista que trabalhava para o Botafogo e que foi o seu grande amigo, aquele que esteve ao seu lado até o dia de sua morte. Já Nilton Santos, o lendário jogador do Botafogo e da Seleção Brasileira, foi outro amigo para todas as horas, que protegeu bastante Garrincha sem ser conivente com a autodestruição do amigo.
“Garrincha – Estrela Solitária” bate muito em um tecla já bastante conhecida: a de que é típico do brasileiro idolatrar e abandonar na mesma proporção os seus ídolos. É verdade que Garrincha morreu decadente, pobre, abandonado e humilhado. No entanto, ele teve várias oportunidades para abandonar o vício. A questão é que não se podia salvar alguém que não queria ser salvo. Ele era, ironicamente, a encarnação do apelido carinhoso de seu time: a Estrela Solitária (apesar de estar rodeado de pessoas que o amavam). Essa sensação de solidão era o espírito que deveria estar presente no filme.