No coração do mar (In the heart of the sea) é um filme subestimado, tem uma narrativa envolvente com camadas e substância que além de ter um significado, é tecnicamente impecável e extremamente bem executado.
Em termos narrativos o filme pode parecer meio perdido para alguns, sem um foco central muito claro, mas dentro da temática de impotência do filme encaixa perfeitamente, o longa começa dando foco na disputa de comando sobre o navio entre seu capitão e seu primeiro imediato, uma disputa de superioridade, ambos tentam provar que são superiores e tentam ao máximo fazer seu “adversário” parecer inferior e impotente, seja por demonstrar mais experiência ou por tentar se elevar por questões de classe social, isso acaba levando a um conflito que leva o espectador a pensar que se trata do foco central da trama, mas isso munda com a introdução da baleia, que é tratada aqui como não um mero animal, mas sim um ser quase mitológico, o que é algo interessante, todas as cenas em que ela aparece tem uma carga, um peso, você sente a superioridade e a imponência dela, e assim que esses dois homens tentando lutar por domínio se chocam com algo infinitamente superior isso quebra esse arco e começa um novo pra demonstrar a superioridade da natureza acima do homem, algo que é evidenciado em vários momentos e até mesmo em diálogos durante toda a duração.
Mas além desse contexto de impotência o filme ainda conta com uma parte técnica nada menos do que IMPECÁVEL, a reconstituição de época e a criação de mundo são balanceadas e perfeitas pra nos jogar dentro daquela época, são locações sujas e insalubres, o que as deixa ainda mais reais devido ao contexto daqueles locais, o design de produção e o trabalho de figurino também ajudam nesse quesito, o que torna a imersão absurda, a montagem e a edição funcionam tanto pra deixar a trama com um ritmo sempre ágil e pra dar aquela agitação nas sequências de ação, que são o exemplo perfeito de um “Caos bem controlado”, elas são caóticas, a edição da um clima frenético com cortes rápidos e uma câmera na mão que dão um efeito realista essencial pra que elas tivessem impacto, é uma ação que contém estilo sem perder a coesão, ajuda também dos excelentes efeitos visuais, de uma trilha sonora que dá o tom mais agitado que essas sequências imploravam, mas também contribui bem nos momentos mais calmos e intimistas do filme e do trabalho de penteado e maquiagem que é impecável, e a devoção dos atores em perder peso também é admirável.
Falando no elenco os praticamente todos estão muito bem em seus respectivos papéis, alguns se destacam mais do que outros, mas estão todos funcionais, Chris Hemsworth encarna um personagem que começa confiante e arrogante mas conforme as coisas vão acontecendo ele vai perdendo esse ar pra dar lugar a um tom muito mais sem rumo e desiludido, todos os seus anos no mar não serviram pra nada dentro de uma situação tão anormal quanto a que ele se meteu, seguindo um caminho parecido temos Benjamin Walker mas por alguns motivos diferentes, em vez de ser confiante ele se engrandece devido a sua condição social e pelo nome de sua família, como se isso fosse o bastante pra torná-lo superior e mais experiente de alguma forma, Tom Holland está funcional dentro da proposta, mas sua vivacidade e reações mais “exageradas” são bem convincentes.
O que mais se destaca do elenco é Brendan Gleeson por carregar uma carga dramática gigante, ele tem um peso gigante na consciência e isso fica imprimido em sua expressividade facial, corporal e vocal.
A única crítica que tenho a fazer é que o filme perde a oportunidade e abordar aquela rixa clássica de homem contra a natureza que é algo essencial em “Moby Dick”, e que embora esteja presente aqui é de uma forma extremamente superficial.