Uma grande expectativa rondava este filme. Lembro-me que vários comentários surgiram nas redes sociais, há muitos meses atrás, ao postarem uma foto do ator Eddie Redmayne travestido de mulher. Muito se cogitou sobre indicações a prêmios mundo afora (o que foi concretizado, e mais do que justamente). Fiquei até curioso em ler o livro baseado na tal história do pintor casado com uma mulher e que se descobriria uma transexual, sendo a primeira pessoa a ser submetida a esta tão controversa e arriscada cirurgia de mudança de sexo. Einar (Redmayne, mais uma vez em interpretação tocante e irrepreensível) é um pintor casado com Gerda (Alicia Vikander, também em atuação excepcional). Certo dia, uma das modelos de Gerda não pode comparecer para que a artista dê os toques finais de um retrato, e então ela pede ao marido para usar meias femininas e cobrir-se com um vestido, em tom até de brincadeira, para que ela consiga concluir sua pintura. Só que a partir deste momento, o lado feminino de Einar ganha as formas de Lili. Obviamente se trata de algo que estava oculto e adormecido por muitos anos, e a partir deste momento foi “reaflorado”. A partir daí, um mundo de descobertas e tensão entre personalidades toma corpo elevando a vários questionamentos tanto de Einar quanto de Gerda. O filme tinha tudo pra ser excepcional. Parte técnica impecável, atores em atuações marcantes (e diria até memoráveis) e um tema interessantíssimo. Pena que não há profundidade em tudo isso. Todos os dilemas e incongruências ali retratados são apenas pincelados e romanceados. Há cenas incríveis, mas tudo parece amenizado de tal forma a ser tratado com uma leve história de amor de incompatibilidades. E o fato de eu estar lendo o livro, que é muito mais elaborado, complexo e pertinente, faz com que minha visão crítica sobre o filme não seja tão favorável. Várias importantes passagens do livro são amplamente simplificadas (algo que é até compreensível), mas que faz com o que o filme perca fluidez. Várias passagens, aliás, são alteradas numa frustrada tentativa de coesão narrativa. O filme está longe de ser ruim, afinal, é ainda assim um sensível retrato de um casal “diferente”, que age verdadeiramente por amor, mas que tem de enfrentar barreiras quase que sobre-humanas em busca de sonhos idealizados aparentemente inalcançáveis: o de Lili, se tornar fisicamente uma mulher, “matando” o seu lado “Einar” até então dominante; e o de Gerda, que ama incondicionalmente o marido e que se vê numa tremenda sinuca de bico, entre apoiar o sonho da pessoa que ama, e ter de ceder um futuro ao lado do grande amor de sua vida. É um belo filme, embora deveras romanceado, que poderia ter equilibrado melhor entre a boa intenção e a real execução de uma obra que poderia ser bem mais contundente.