MAHNA MAHNA
por Lucas SalgadoUma crítica deve sempre analisar ao máximo os aspectos técnicos de um filme, tratar da fotografia, da montagem, da mixagem e de muitos outros elementos que compõem uma produção cinematográfica. Mas também é importante para o crítico passar para o leitor quais sentimentos o longa assistido despertou. Volta e meia, acaba surgindo uma crítica azeda e até demasiadamente pesada pois é difícil para uma pessoa que Adora Cinema deixar passar coisas que desrespeitam a sétima arte. Com relação a Os Muppets o desafio é conseguir neste texto expressar o sentimento que emana ao conferir o mesmo, afinal é uma emoção tão genuína e de uma nostalgia tão bonita que acaba interferindo com qualquer objetividade.
Felicidade. Esta é uma palavra que pode descrever bem a sensação de quem assiste a nova aventura dos personagens criados por Jim Henson. Ainda que leve alguns minutos para nos reencontrarmos com a turma principal, já no início com os novos personagens somos colocados em um estado de alegria que dura quase todo o filme. É difícil tirar o sorriso do rosto durante a projeção e aí está o principal mérito de Os Muppets.
O longa conta a história de Walter, um grande fã dos Muppets e viaja para Los Angeles ao lado do irmão Gary (Jason Segal) e da namorada deste, Mary (Amy Adams). Enquanto que o casal deseja comemorar o aniversário de namoro, Walter quer visitar o Teatro dos Muppets. Lá acaba descobrindo o plano maligno do magnata do petróleo Tex Richman (Chris Cooper) de demolir o local. Com isso, o trio procurará a pessoa (ou boneco) indicada para reunir a turma e salvar o espaço: Caco. (Aqui cabe uma observação, eu não conheço nenhum Kermit. Pra mim é Caco e não se fala mais disso. Se você faz parte da turma que chama o ursinho Puff de Pooh e a Sininho de Tinker Bell, sinta-se a vontade para discordar.)
É quase impossível para quem acompanhou os muppets quando pequeno não sentir um clima de nostalgia, de reminiscência com o filme, mas o mais interessante e surpreendente é que o clima que impera na produção é o de frescor. Não é um longa retrô e nem tem "cheiro de naftalina". Todo o desenvolvimento é feito com uma aura de novidade impressionante.
É certo que alguns dos números musicais são bobinhos e redundantes e que as presenças de Segal e Adams são quase que decorativas, mas é muito difícil não gostar de The Muppets (no original). É curioso notar que o filme tem um caráter quase que documental. A trama é dura ao apontar que o mundo praticamente esqueceu os personagens e que eles não interessam mais comercialmente, mas a verdade é que isso de fato aconteceu. E o longa é uma espécie de carona para voltarem ao sucesso.
Se os personagens irão retomar a fase estelar de décadas atrás é difícil dizer, mas é seguro afirmar que eles continuam nos corações e mentes de muitas pessoas, e que foi muito bom revê-los em forma, sem precisarem de piadas vazias ou de baixo calão. Não foi por outro motivo que assim que Eddie Murphy desistiu de apresentar o Oscar 2012, que iniciou-se uma campanha nas redes sociais para que os bonecos fossem os responsáveis pela cerimônia. Infelizmente, a Academia foi mais conservadora e convocou Billy Crystal para a função.
Quando falo que Jason Segal tem uma presença discreta na história, não quero dizer que não tem importância, afinal este filme jamais existiria sem ele. O ator assina o roteiro e ainda acumula a função de produtor executivo. Foi uma das pessoas fundamentais para convencer a Disney a botar dinheiro no projeto.
O roteiro, também de responsabilidade de Nicholas Stoller (As Loucuras de Dick e Jane), conta com inúmeras auto-referências e com uma deliciosa metalinguagem. Além disso, apresenta alguns conceitos inovadores e interessantíssimos, como "viajar por mapa" e "seleção com ajuda da montagem". A jornada de Caco para reencontrar Miss Pig, Animal, Gonzo, Fozzie e companhia é não apenas bonita, mas também bem desenvolvida.
Como não poderia deixar de ser, a trilha sonora é um dos destaques da obra. Embora algumas canções originais sejam simplesmente corretas, outras são absolutamente marcantes, como "Man or Muppet?". Isso sem falar nas tradicionais "The Rainbow Connection", que é bela e nostálgica, e "Mahna Mahna".
Além de Segal e Adams, o elenco conta com a presença de outros nomes importantes em participações especiais, como Zach Galifianakis, Emily Blunt, Jack Black, Whoopi Goldberg, Alan Arkin, John Krasinski e Neil Patrick Harris. Todas as pontas são divertidas, mas é impossível não destacar as de Black e Blunt. O primeiro vive uma espécie de padrinho de Animal em seu tratamento contra os excessos de fúria, enquanto que a atriz atua numa referência clara a sua personagem de O Diabo Veste Prada.
Todos os atores parecem ter se divertido muito durante suas participações e em momento algum mostram-se dispostos a roubar a cena dos verdadeiros protagonistas. Talvez a performance menos especial seja a de Chris Cooper. Inicialmente, faz bem o papel do magnata sem coração, mas vai perdendo foco e espaço ao longo da trama, exigindo do roteiro uma solução simplista.
Os Muppets é um filme para toda a família. Quem cresceu nas décadas de 70 e 80 deve sentir um aperto especial no coração, mas é bem provável que as crianças de hoje também se encantem com a história. Aproveitando a letra de "The Rainbow Connection", posso dizer que trata-se de um longa para apaixonados, para sonhadores e, sem dúvida, para mim.