O que acontece com a gente quando somos privados de um sentido vital? A resposta está nesta obra interessantíssima de Fernando Meirelles, Ensaio Sobre a Cegueira. A população vive uma epidemia de cegueira, um tipo de cegueira leitosa, intransponível que é chamada de “cegueira branca” pelos especialistas, ou seja, as pessoas enxergam uma camada branca sobre os seus olhos. Quando todos parecem estar infectados, uma mulher misteriosa e esperançosa, enxerga tudo o que está à sua volta: o marido médico, mulheres e homens atingidos pela impotência, desejo, vergonha e instintos selvagens. O governo os coloca em quarentena, num sanatório onde vivem como animais em condições extremamente inadmissíveis, lutando por comida, dignidade e sobrevivendo de maneira desumana. A mulher que ficou imune à cegueira tenta os conduzir, de maneira amigável, e os guiar para fora do local onde foram aprisionados.
Fernando Meirelles, diretor do fenômeno Cidade de Deus, foi incumbindo de transformar o livro de José Saramago em filme. A crítica ficou dividida em relação à adaptação, contudo a visão crítica do diretor é bem ampla sobre o comportamento do ser humano e traz a tona as questões morais e físicas presentes na trama de José Saramago. Nos perguntamos o porquê de todas as ações, práticas e insultos cometidas entre os personagens sem nome, sem rumo e sem visão. O autor não nomeia os personagens, temos que descobri-los através de suas atitudes, despertando dentro de nós a curiosidade de saber o que se passa na mente das vidas ali descritas.
Imaginamos que perder a visão não é somente deixar de ver as coisas, mas sim se aproveitar da falta dela para cometer atrocidades e barbarismos, pois se você não vê, ninguém vê também. A obra é uma parábola de como nós precisamos enxergar a nós mesmos para poder enxergar o próximo e o quanto isto é difícil se de difundir.Um relato interessante sobre a vida, a doença, a razão,a sobrevivência transpostos na visão analítica desse grande escritor português.
O filme é muito bom, vale a pena ressaltar a interpretação impecável da atriz Julianne Moore e do ator Mark Ruffalo. Fernando acertou na escolha do projeto, o bom sinal disso é que diretor brasileiro não faz só novelinha.