A minissérie de mistério estrelada por Natalie Portman que passou muito despercebida: Um fascinante suspense de época com questões raciais e sociais
Eduardo Silva
-Redator
Jornalista que ama filmes sobre distopias e animes de battle royale. Está sempre assistindo alguma sitcom e poderia passar horas falando sobre Yu Yu Hakusho e Jogos Vorazes.

A Mulher no Lago estreou neste ano no Apple TV+.

No “campo de batalha” dos conteúdos de streaming, muitos filmes e séries estreiam sem chamar muita atenção dos espectadores e/ou rapidamente caem no esquecimento. Esse é o caso de A Mulher no Lago, uma minissérie de mistério que chegou ao Apple TV+ em julho de 2024, fazendo pouquíssimo barulho.

E não é um caso isolado... Esse é um problema comum na plataforma da Apple, o que provavelmente levou a um corte nos gastos dessas megaproduções que tendem a adaptar obras literárias em minisséries, arrastando também alguns problemas comuns devido ao formato: primeiros atos densos e falta de adaptação da prosa à imagem, por exemplo. A Mulher no Lago, em particular, é uma adaptação do romance homônimo de Laura Lippman.

Duas mulheres, duas faces da sociedade

A minissérie tece uma narrativa complexa tendo como pano de fundo a cidade de Baltimore de 1966, repleta de tensões sociais e raciais, onde acompanhamos Maddie Schwartz (Natalie Portman), uma dona de casa judia que abandona sua vida confortável para se tornar uma jornalista investigativa.

Sua incursão no mundo da reportagem criminal a coloca frente a frente com as duras realidades de uma sociedade dividida por raça e classe quando o caminho dela cruza o de Cleo Johnson (Moses Ingram), uma mulher negra que trabalha para melhorar sua comunidade.

A minissérie começa no Dia de Ação de Graças com o desaparecimento de uma menina, desencadeando uma cadeia de acontecimentos que entrelaçam as vidas de Maddie e Cleo. A descoberta do corpo da garota em um lago leva Maddie a aceitar um emprego no The Baltimore Star, onde ela usa sua nova posição para investigar o lado obscuro da cidade.

Enquanto isso, Cleo confronta sua própria comunidade ao lidar com as ambições do marido e a dura realidade da época para os afro-americanos. Algo que nos leva a uma narrativa paralela que, a princípio, parece pertencer a duas séries diferentes, e é aqui que A Mulher no Lago exige um pouco de paciência (poderia ser resolvido em seis, em vez de sete episódios), mas que mais tarde será recompensada.

Isso porque o contraste entre as duas linhas de enredo fala de uma sociedade segregada, inspirada, por sua vez, em dois assassinatos reais ocorridos na cidade em 1969 que não estavam relacionados. Um deles foi a descoberta do cadáver em decomposição de uma mulher que logo foi identificada como Shirley Lee Parker.

Baseada em fatos reais

As circunstâncias da morte da garçonete e contadora negra de 35 anos, que havia desaparecido semanas antes, ainda são desconhecidas. O caso de Parker recebeu pouca atenção no jornal oficial da cidade de Maryland, o Baltimore Sun, em comparação com o assassinato de Esther Lebowitz, uma menina judia branca de 11 anos que desapareceu depois da escola no mesmo mês de setembro. Esse caso foi notícia de primeira página e gerou um fluxo constante de manchetes e cartas ao editor.

Para a autora do livro original, ambos os tratamentos na imprensa são um reflexo dos preconceitos raciais que influenciaram a cobertura da mídia e a percepção do público durante aquela época, e foi isso que a levou a escrever o romance, que tenta capturar a resposta da comunidade quando as vítimas vêm de diferentes origens raciais.

A série deixa pistas sobre como Maddie e Cleo acabam sendo mulheres limitadas pelas normas sociais da década de 1960, ambas resistindo à misoginia em cada pequeno detalhe de suas vidas conjugais ou profissionais. A jornada pessoal das protagonistas torna-se, assim, um retrato histórico de um período tumultuado da história americana, e a escolha de Baltimore como cenário acrescenta autenticidade, já que a própria cidade se torna um personagem forjado através das camadas espinhosas da discriminação nos EUA.

Portman interpreta uma Maddie complexa, às vezes enervante na forma como se relaciona com a comunidade afro-americana e como não consegue sair do clichê do salvador branco. Mas é em sua própria posição de mulher trabalhadora que ela busca a redenção ao se aprofundar em um caso que ninguém quer ouvir, em uma irmandade evocada por vozes fantasmagóricas e conexões que lembram Noite Passada em Soho.

A Mulher no Lago é uma pequena descoberta que merece ser resgatada na enxurrada de lançamentos semanais de streaming.

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