O satanismo é glamouroso: Como Longlegs usa o rock dos anos 70 e o ocultismo para moldar o personagem de Nicolas Cage

A história de vários ícones e o movimento glam explicam a figura peculiar que perturba a atmosfera do filme de Oz Perkins.

Seja fabricado por uma campanha de marketing genial ou por seus próprios méritos, não há dúvida de que Longlegs gerou expectativa e se tornou o filme de terror do momento - e quem sabe, o filme de terror do ano. Oz Perkins molda uma experiência particular que, para alguns, pode se aproximar da paralisia do sono, para outros, pode ser uma provocação. Mas há muito o que aprender com ele.

É claro que uma das coisas mais interessantes é a forma como o filme une diferentes épocas do terror, explorando medos muito reais e familiares na veia do cinema atual e, ao mesmo tempo, pegando dicas dos thrillers de serial killers dos anos 90 ou do terror sobrenatural dos anos 70.

Inspirações que moldam o personagem assustador e caricato de Nicolas Cage, cujas bases também incluem a história do rock e sua relação com o satanismo. Abaixo, você encontrará spoilers sobre Longlegs e o personagem de Nicolas Cage.

O rock and roll tem um histórico de ser associado à "música do demônio". O Black Sabbath e todos os seus derivados na forma de heavy metal têm sido fortemente associados ao satanismo (às vezes por vontade própria dos músicos). O Led Zeppelin foi a julgamento por supostamente incluir mensagens satânicas em Stairway to Heaven que podiam ser ouvidas ao tocar a música ao contrário. Charles Manson, uma clara inspiração para o Longlegs de Cage, atribuiu a motivação para formar seu culto ao que ele ouviu subliminarmente em Helter Skelter dos Beatles.

Tudo isso se enquadra no que poderia ser classificado como o espectro do rock mais pesado do final dos anos 60 e 70, um período mencionado por Perkins em seu filme. No entanto, elas não foram as bandas mais intensamente ligadas ao fenômeno oculto, que é o que realmente é mencionado em Longlegs. Nem é o que Perkins usa como influência fundamental. A resposta está naquele fenômeno muito particular e fluido que foi o glam rock.

Marc Bolan como um dos pilares

Enquanto qualquer outro cineasta teria aberto esse filme com uma passagem bíblica ou uma referência satânica, o diretor nos apresenta os versos de Marc Bolan, o músico por trás do grupo T. Rex: “Well you're slim and you're weak / You've got the teeth of the hydra upon you / You're dirty, sweet, and you're my girl” pertence ao seu icônico hit de 1971, Bang a Gong (Get It On), servindo como uma prévia da relação que a detetive de Maika Monroe terá com as forças do mal no filme.

Em entrevistas para promover o filme, Perkins detalhou como a descoberta do T. Rex em um documentário musical na Apple TV+, 1971: The Year That Music Changed Everything, desbloqueou criativamente a história de Longlegs, tanto do personagem quanto do filme. “Isso se tornou uma estranha sinergia na qual me baseei”, disse ele a Rolling Stone. As letras de Bolan eram para ele “a mistura perfeita de poesia bíblica e demoníaca e glam rock”, e a chave para moldar toda a mitologia do personagem de Cage.

Acabou fazendo sentido que ele transformasse Longlegs em um cara do glam-rock cuja vida havia sido interrompida nos anos 70. Ele só queria ser um cara do glamour do rock. Talvez ele tocasse mal a guitarra no porão da casa da mãe. Então, um dia, sua vida mudou e ele teve que trabalhar para o Diabo.

É interessante notar que o ator se conectou com essa visão específica que o cineasta estava criando. A estética pálida de Bolan no palco e os gráficos de seus discos acabaram sendo transferidos para o visual exagerado e perturbador que Cage emprega para se transformar em Longlegs. O vilão acaba cantando histrionicamente várias de suas músicas no filme, e seu covil é decorado com obras do T. Rex e também de Lou Reed da era Transformer, onde ele também se tornou um ícone do glam rock.

Discos como Electric Warrior, que impulsionaram a carreira do T. Rex, não foram necessariamente marcados pelo satanismo ou pelo ocultismo. Entretanto, o passado da banda, quando era conhecida como Tyrannosaurus Rex e tinha uma aura mais hippie e psicodélica, continha muitas referências a autores ocultistas. Bolan também publicou o livro Warlock of Love em 1969, com muitos flertes com esse tipo de literatura.

Os autores ocultistas acabaram sendo uma forte influência no movimento do glam rock. David Bowie, outro ícone do gênero, fez muitas referências ao nome e à obra de Aleister Crowley em seus primeiros trabalhos. A Electric Light Orchestra tinha suas músicas provocativas que flertavam com o ocultismo. O KISS, uma banda mais próxima do glam do que do espectro do hard rock, ostentava a servidão a Satanás para aumentar suas ofensas públicas.

Perkins pode não ter tido em mente esse legado ocultista no gênero que estava tentando resgatar para dar a Longlegs uma atmosfera diferente, mas certamente se inspirou muito em seu espírito rebelde e fluido para forjar a base de sua criatura incômoda. Ele certamente reflete uma visão muito específica do fenômeno do assassino em série, que se tornou tão mitificado pela cultura do True Crime, mas que Perkins tenta quebrar e até rejeitar. Aspectos que fazem deste um dos filmes mais interessantes de 2024. Longlegs - Vínculo Mortal estreia em 29 de agosto, nos cinemas brasileiros.

*Conteúdo Global AdoroCinema