Críticas AdoroCinema
4,5
Ótimo
A Delicadeza do Amor

Coisas da vida

por Francisco Russo

Ninguém escolhe quando se apaixonar. Pode até tentar dar uma força ao destino, saindo com pessoas e estando disposto ao relacionamento, mas nunca se sabe exatamente quando e com quem dará certo. Esta incerteza por vezes traz sofrimento, pela ansiedade de que o tiro acerte o alvo o quanto antes, gerando até mesmo uma certa repulsa. "A felicidade é quando não há", diz uma personagem do filme, preocupada com o fracasso de mais uma tentativa. Pura auto-proteção, tentativa de se manter firme diante das coisas da vida. Não é o que acontece com Nathalie, personagem principal do sensível A Delicadeza do Amor. Ela tem um relacionamento sólido com François, com quem está prestes a se casar. Felizes, são o chamado casal perfeito até que, um dia, o destino age contra. Ele morre, vítima de um acidente de trânsito.

O luto é inevitável. Brutal, imenso, inconcebível. Como pode tudo ser destruído assim, em uma fração de segundos, quando menos se espera? A dor que Nathalie sente é só dela, assim como a paixão. Entretanto, viver é inevitável. Apagar os rastros, por menores que sejam, é doloroso. Superar o trauma requer cuidado e tempo, sem previsão de término. É necessário se fechar para sobreviver, mergulhar no trabalho para ter com o que se ocupar. Por enquanto.

A jornada de felicidade e dor de Nathalie poderia facilmente transformar A Delicadeza do Amor em um tremendo dramalhão sobre o sofrimento. Motivos para tanto não faltam, como se pode perceber pelos parágrafos acima. Entretanto, os diretores David e Stéphane Foenkinos estão mais interessados em outro aspecto de sua protagonista: o recomeço. A dura e lenta caminhada para voltar a sorrir e sair do casulo imposto a si mesmo, sem deixar de lado os traumas do passado e medos do futuro. Assim é Nathalie, assim também é Markus. Um novo ciclo, para ambos.

É claro que nada é fácil. Há toda a conquista, a luta contra a rejeição e o medo. Entretanto, pequenos detalhes fazem a diferença por refletirem tão bem o quanto se quer bem o outro. É assim, pouco a pouco, que a magia acontece. Sem perceber, às vezes sem nem mesmo querer, o cupido acerta em cheio. Touché!

A Delicadeza do Amor impressiona pela sensibilidade com a qual trata toda esta jornada do céu ao inferno, e a tentativa de mais uma vez colocar a cabeça fora d'água. Poético, trata com carinho seus personagens principais, Nathalie e Markus, interpretados de forma cativante por Audrey Tautou e François Damiens. Um filme por vezes necessariamente duro, para atingir a profundidade do momento retratado, mas que consegue também dosar com sequências divertidas e delicadas. Excelente, um dos melhores do ano até o momento.