Bebendo de uma fonte conhecida
por Vitória PratiniSeguindo a fórmula de sucesso de Piratas do Caribe e tantas outras produções, a Disney uniu dois dos maiores nomes do cinema na atualidade — Dwayne Johnson e Emily Blunt — em um filme com ares de Sessão da Tarde. Não dá para negar que Jungle Cruise, inspirado na atração de mesmo nome nos parques temáticos da companhia, é clichê e previsível, além de mostrar a Amazônia dos anos 1916 totalmente irreal. No entanto, é uma aventura bem construída, que bebe de inspirações em Indiana Jones, A Múmia e Uma Aventura na África.
Jungle Cruise reprisa fórmula que foi sucesso nos primeiros Piratas do Caribe
Em 2003, a Disney se viu com uma mina de ouro nas mãos ao lançar Piratas do Caribe, inspirado no famoso brinquedo de seus parques. Só que essa fonte da juventude — perdão pelo trocadilho — se esgotou junto com o “cancelamento” de Johnny Depp, e os dois últimos filmes da franquia, lançados em 2011 e 2017, não renderam tanto quanto o esperado. O estúdio até tentou replicar o sucesso A Mansão Mal-Assombrada e Tomorrowland - Um Lugar Onde Nada é Impossível, mas não teve êxito. Felizmente, Jungle Cruise não é uma dessas produções. O longa-metragem não é um desastre mas não traz nada de inovador, podendo facilmente ser esquecido.
Reprisando (e reciclando) uma fórmula há muito explorada, o filme acompanha o malandro e brincalhão Frank Wolff (Johnson). Capitão do barco La Guilla, ele faz passeios turísticos pelos rios da Amazônia brasileira em 1916, soltando inúmeras piadinhas e trocadilhos — que nem sempre convencem na voz de Dwayne Johnson — e “armando” ataques de nativos para impressionar a clientela. Não muito diferente do que fazem os guias da atração Jungle Cruise nos parques da Disney. Do outro lado, a Dra. Lily Houghton (Blunt) e seu irmão McGregor (Jack Whitehall) estão em busca de um barco para levá-los pelas densas florestas amazônicas a fim de encontrar uma misteriosa árvore com poderes de cura que poderá mudar para sempre o futuro da medicina. É claro que eles contratam Frank e, juntos, enfrentam diversos perigos no caminho, até mesmo forças sobrenaturais.
Não só no clima aventura que Jungle Cruise se assemelha a Piratas do Caribe ou A Múmia. Tal como seus predecessores, o filme de The Rock traz cenas coroadas com tiradas humorísticas, tanto na fala e na excelente trilha sonora quanto nas sequências de ação — como quando a personagem de Emily Blunt heroicamente se pendura em uma tirolesa, mas dá de cara com um saco de grãos. Outro elemento que se repete é a temática sobrenatural, com seres perigosos formados a partir da selva (e isso inclui raízes, cobras e até abelhas), muito semelhante aos piratas fantasmas de A Maldição do Pérola Negra e à própria Múmia.
Dwayne Johnson e Emily Blunt brilham no lado humorístico
De fato foi uma boa ideia juntar Emily Blunt e Dwayne Johnson no mesmo filme. A atriz, que também está em cartaz nos cinemas com Um Lugar Silencioso 2, prova mais uma vez seu talento como uma heroína empoderada, que usa calças e não vestidos no início do século XX (como o filme faz questão de exaltar inúmeras vezes). Já The Rock — depois de viver alguns brucutus nos cinemas, especialmente Hobbs na franquia Velozes & Furiosos — aposta na sua veia cômica de forma muito natural.
Apesar da excelência inegável dos protagonistas, a química entre eles não convence de primeira. Isso se deve ao fato de que o roteiro não investe tempo no desenvolvimento de cada personagem individualmente.
É o caso também de McGregor, interpretado por Jack Whitehall. Alívio cômico em diversas cenas, ele ganha uma cena mais profunda na qual revela que é homossexual. Quer dizer, deixa nas entrelinhas, como uma forma de suavizar o tema e checar a caixinha “diversidade".
Blunt, Johnson e Whitehall são ofuscados em cena pelo excelente Jesse Plemons (Breaking Bad, Estou Pensando em Acabar com Tudo), no papel do vilão Príncipe Joachim, um alemão que quer o poder da cura para ganhar a Primeira Guerra Mundial. Ainda que toda construção do personagem grite “clichê”, Plemons, cujo currículo é repleto de antagonistas, consegue subverter esse fato a seu favor e até mesmo convencer em um diálogo com uma abelha.
Embora o enredo seja previsível e clichê, com falas cafonas e cenas improváveis, traz algumas reviravoltas. O diretor Jaume Collet-Serra consegue conduzir a trama com leveza e cuidado, transformando em uma aventura que tem a cara da Disney. Certamente bem diferente da seriedade dos demais projetos de seu currículo, que incluem os filmes de terror A Casa de Cera e A Órfã e os longas de ação Sem Escalas e O Passageiro, estrelados por Liam Neeson. Destaque positivo para a fotografia, design de produção e efeitos visuais feitos pela Weta Digital.
Jungle Cruise peca na representatividade da Amazônia brasileira
Jungle Cruise traz representatividade feminina, LGBTQIA+ e latina — na figura do vilão Aguirre, vivido pelo venezuelano Édgar Ramírez (American Crime Story). No entanto, quando se trata de representar o Brasil, o filme erra feio. Primeiro, não há nenhum brasileiro no elenco e na equipe. Nem mesmo os índios são interpretados por nativos. Os habitantes da Amazônia falam português com sotaque, enquanto outros simplesmente apostam no espanhol ou falam inglês entre si. Os personagens fazem negociações em real, sendo que, no início do século XX, o mil réis que era usado como moeda no Brasil. A nossa lenda do “boto cor-de-rosa” é completamente diferente do que é citado. Por mais que seja um filme de fantasia, que tome liberdades poéticas, é responsável por vender a imagem do nosso país para o exterior, especialmente pelo alcance que produções da Disney tem.
Relevando essas questões, Jungle Cruise acaba sendo divertido, e belíssimo visualmente. Difícil não lembrar de The Rock em O Escorpião Rei em sua cena lutando com uma onça pintada.
Último filme a ser lançado pelo Premier Access do Disney+, produção está em cartaz nos cinemas e no serviço de streaming.