Críticas AdoroCinema
2,5
Regular
Homem-Aranha 3

Herói perfeito, humano imperfeito

por Barbara Demerov

Após ser iniciada de maneira tão impactante durante uma época em que filmes de super-heróis ainda estavam surgindo no horizonte e fazer com que milhares de pessoas se aproximassem de Peter Parker muito além dos quadrinhos, a trilogia Homem-Aranha, dirigida por Sam Raimi, não foi encerrada no topo de seu potencial. Se já é difícil dar continuidade a um arco muito bem resolvido apresentado anteriormente, pode-se dizer que a pressão para a retomada da saga do amigão da vizinhança após passar pelas mãos de Dr. Octopus (Alfred Molina) estava alta. Talvez seja por isso que tantos elementos e personagens foram inseridos neste capítulo, que, de monumental, possui apenas a aparência.

Numa tentativa de tornar Peter Parker (Tobey Maguire) mais humanizado e dono de falhas que vieram com a fama de herói, Homem-Aranha 3 mostra-se capaz de iniciar uma reflexão importante: após os poderes e a administração de responsabilidades, como fica a vida da pessoa por trás da máscara? Peter surge aqui mais confiante do que nunca ao lado de Mary Jane (Kirsten Dunst) e com a plena noção de que é alguém crucial para a cidade de Nova York. Contudo, o surgimento de obstáculos na vida do casal não tardam a aparecer, uma vez que a personagem não obtém sucesso na Broadway e não encontra o apoio que necessita de seu parceiro. Como pode ser visto desde o primeiro Homem-Aranha, a construção deste relacionamento continua sendo o cerne da história do herói, assim como o catalisador de diversos acontecimentos.

Mas, ao mesmo tempo, o arco de Peter como indivíduo não é tratado com a devida seriedade e inúmeras tramas paralelas são expostas sem muito cálculo, o que inclui as breves histórias de Flint Marko/Homem-Areia (Thomas Haden Church), Eddie Brock (Topher Grace) e Gwen Stacy (Bryce Dallas Howard). O único personagem que possui uma motivação mais convincente diante de todo o cenário catastrófico logo provocado acaba por ser Harry Osborn (James Franco), que busca vingança pela morte do pai, Norman (Willem Dafoe) e que, de certa forma, entregando um respiro em meio a tantas superficialidades inseridas simplesmente por se tratarem de figuras famosas dos quadrinhos. A própria segurança exagerada de Peter torna-se um tanto cômica pela rapidez com que é desenvolvida, por mais que seus traços egoístas sejam exibidos antes de sua aproximação com o simbionte capaz de mudar personalidades.

No mais, o estilo cartunesco de fato é uma das características que mais se mantém viva no filme de Raimi – seja com a ação desenfreada em Nova York ou com cortes inesperados que mais parecem sair de páginas das HQ's, como quando Brock sequestra Mary Jane no ato final. Aliada à direção fluida, este elemento é realmente um acerto, mas há muito a ser mostrado em pouco mais de 2h. Se por um lado a relação com MJ conecta Peter e Homem-Aranha de maneira natural, por outro sua intriga com o também fotógrafo Eddie Brock não funciona pela ausência de uma causa mais convincente; e o mesmo pode ser dito sobre a maneira como o simbionte Venom chega à Terra, sem a mais ínfima das explicações.

Homem-Aranha 3 também faz péssimas escolhas com um dos três vilões da trama: o Homem-Areia, que ganha este nome após fugir da polícia e entrar em um experimento científico. Além de possuir uma motivação rasa (ele é ladrão para providenciar um tratamento melhor à filha doente), o antagonista também acaba sendo trabalhado como o responsável pela morte de tio Ben, ocasionando a raiva de Peter pela justiça ainda não realizada e, posteriormente, uma possibilidade do protagonista enxergar a mesma situação sob outro olhar. Este plot, o mais próximo à humanidade do herói, teria mais peso emocional se não fizesse parte da conjuntura definitiva do filme, onde mais de um vilão está em ação e alguns deles se unem pelos motivos mais limitados possíveis – principalmente se colocarmos na balança a visão de Octopus com relação ao Homem-Aranha e o mundo.

A intenção de fazer jus à vastidão do universo do teioso nas telas começa de forma lúcida e divertida, mas no meio do caminho tudo vai se perdendo lentamente, até chegar a soluções rápidas que parecem afetar Peter subitamente, e não de uma maneira mais íntima e realmente transformadora. Junto a tantos personagens e perspectivas, a maior mensagem desta importante trilogia do cinema de heróis é a de que, apesar de termos um excesso de camadas que não se conversam diretamente, ao menos vemos personagens que se misturam a fim de fazer com que o protagonista volte a si. No fim, ter a chance de escolher um bom caminho é o que faz Peter Parker saber quem ele é. Sem máscara alguma.