Natural-orgânico-gluten free. E muito bem temperado!
por Renato HermsdorffDizem que um é bom, dois é pouco, três é demais. Hollywood sempre ouviu. Em sua voracidade financeira (alguém pode culpá-la?), a indústria do cinema encontrou num público acomodado (alguém pode culpá-lo!) o filão para explorar um bocado em sequências, reboots, spin-offs e afins, dos quais a própria franquia Jurassic já foi vítima. Jurassic Park - Parque dos Dinossauros (1993) é tão bom, que deu vontade de ver mais; O Mundo Perdido - Jurassic Park (1997) foi o "mais", mas simplesmente “ok”; já Jurassic Park 3 (2001), convenhamos, foi excessivo.
Evoluamos. Independente de “bom” ou “ruim”, “melhor” ou “pior” (que os anteriores), Jurassic World - O Mundo dos Dinossauros, que agora chega aos cinemas, é um embate constante entre o passado e o futuro, do qual quem sai ganhando é o presente.
Descontada uma leve pieguice sentimental (consegue pensar em uma frase mais cafona do que “em um embate constante entre o passado e o futuro, do qual quem sai ganhando é o presente”?), o filme é a comprovação do excelente momento criativo de Hollywood no que diz respeito às sequências, reboots, spin-offs e afins - a exemplo de Planeta dos Macacos - A Origem (2011) e seu subsequente Planeta dos Macacos: O Confronto (2014) e, mais recentemente Mad Max: Estrada da Fúria (a ver com O Exterminador do Futuro: Gênesis).
Logo no início de O Mundo dos Dinossauros, Claire (Bryce Dallas Howard, quase uma boneca, o que é proposital e compreensível), administradora do parque, relembra que lá se vão duas décadas desde a “desextinção” dos dinossauros (o que bate com a idade do primeiro filme), para afirmar que, nos últimos dez, a tecnologia evoluiu um tanto (o que bate com a realidade técnica cinematográfica). É uma pista de que o novo filme seria o equivalente ao velho longa (o primeiro), só que alimentado por vinte anos de desenvolvimento das técnicas de efeitos especiais. Dito e feito. Há inúmeras referências à origem da franquia e o CGI é fantástico.
Pois bem: passado tanto tempo desde os episódios traumáticos de 1993, o parque, finalmente, é reaberto ao público. O menino Gray (Ty Simpkins), que saca tudo de dinossauros, e seu irmão pré-adolescente Zach (Nick Robinson) viajam para ilha, a fim de conhecerem o tal eldorado e, de quebra, passar um tempo com a tia Claire, que não veem faz tempo. Bancado pelo investidor internacional Masrani (o ator de origem indiana Irrfan Khan), lá trabalha também Owen (Chris Pratt), que conseguiu significativos avanços na domesticação dos velociraptors, alvo dos interesses militares de Hoskins (Vincent D'Onofrio). Todo esse mundo vai se chocar quando a Indominus Rex (sim, é uma fêmea), o dinossauro equivalente ao T-Rex lá de trás, só que criado em laboratório, escapa.
Posto assim, parece haver um excesso de personagens, subtramas, conflitos. Mas não há. E cada informação é simbólica e de suma importância para a história, cujo ritmo se desenrola sem tempo a perder ou truques de roteiro. Uma produção, genuinamente, como os estúdios gostam de tachar, para todos os gostos e idades (embora com um nível de violência realmente assustador).
Dirigido pelo quase anônimo Colin Trevorrow, Jurassic World é um filme do mundialmente famoso Steven Spielberg – oficialmente, produtor executivo aqui. Da envolvente trilha sonora épica de Michael Giacchino (vencedor do Oscar por Up - Altas Aventuras) ao deslumbramento infantil do menino Gray (embora não seja o protagonista), é possível notar o dedo (a mão, o braço, as garras) de Spielberg no novo parque.
Egresso do humor, da série Parks and Recreation e como o hilário herói de Guardiões da Galáxia, Pratt segura bem o papel dramático e, até mesmo por conta de seu figurino jaqueta-bege-explorador, lembra um possível (e cotado para o reboot) Indiana Jones do futuro. O alívio cômico (e bota "cômico" nisso) fica sob a responsabilidade de Lowery (Jake Johnson), um dos subordinados à Claire.
Mais do que um tributo a Parque dos Dinossauros, O Mundo dos Dinossauros é um sinal dos nossos tempos, da cultura atual de olhar para trás e valorizar a simplicidade do natural-orgânico-gluten free. Mas temperado com o que há de mais complexo em termos de tecnologia.