Um olhar próximo, mas não íntimo
por Barbara DemerovMichelle Obama possui absolutamente todas as características de uma mulher com capacidade de sobra para conquistar o mundo: inteligência, carisma, presença, muitas histórias e energia cativante. O documentário Minha História faz questão de salientar tais qualidades a todo o momento, mas isso nunca é feito de modo exagerado. Michelle é o que é. A ex-primeira dama assim age de forma completamente natural, e não é por menos que sua popularidade com os norte-americanos mantém-se em níveis elevados.
Mas ainda que desenvolvida com muito apreço através das lentes da diretora Nadia Hallgren, Michelle nunca parece descer de verdade do palanque em que se apresenta a milhares de pessoas. A narrativa do documentário nos faz acompanhar sua tour de divulgação do livro (que dá título ao filme) pelos EUA e possui uma estrutura com talk shows como o do próprio David Letterman para a Netflix. E é exatamente por conta deste estilo que mescla o informal com depoimentos emocionantes, que o nível de aprofundamento com relação à Michelle deixa um pouco a desejar.
Documentário evidencia a serenidade e o bom-humor de Michelle Obama
É pouco, mas esta sensação perdura quando o filme está próximo de acabar. Contudo, é louvável o leque de assuntos que Hallgren traz à narrativa: desde a juventude de Michelle enquanto estudante de Direito até os desafios ultrapassados na sociedade por ser uma mulher afro-descendente, tudo nos é contado pelas próprias palavras da protagonista de um jeito cativante e bem-humorado. É admirável ver a tranquilidade com que Michelle relembra e analisa o cenário estudantil de sua época ou, também, como conta de que modo conheceu seu marido, Barack Obama.
Talvez um dos pontos mais altos de Minha História, enquanto documentário, é o de saber o quão importante individualmente é sua personagem. Michelle é majoritariamente conhecida como ex-primeira dama ou a esposa de Obama, mas aqui o primordial é sabermos de onde ela veio e como ela chegou até onde está atualmente. Suas conquistas não são completamente separadas do marido, tampouco desbancadas pelos feitos enquanto mãe e parceira de Barack nas campanhas, mas é evidente que muito de sua trajetória (e do sucesso que conquistou) se deve essencialmente ao papel que exerceu enquanto mulher - e não enquanto esposa do presidente.
Balanceando todas estas facetas, Minha História ganha traços humanos que incitam ainda mais curiosidade para compreendermos como existe tanta força e energia na pose firme de Michelle. Até mesmo quando revisita sua casa de infância ao lado da mãe e quando relembra a história de seu falecido pai, não é possível vê-la chorar. A rocha de Michelle Obama mantém-se intacta do início ao fim - e é justamente isso que dá a impressão de que há muito mais a ser conhecido com relação à sua pessoa.
Que a ex-primeira dama é uma pessoa inspiradora, dedicada aos seus projetos sociais e preocupada com o futuro da nação, todos já sabem. O filme torna tal visão de sua pessoa ainda mais definida, mas enquanto faz essa tarefa tão bem, não entrega o fator da complexidade - que é essencial para compor um personagem mais humano, seja ele fictício ou real. No caso de Michelle, é essencial reconhecer o quão generosa é; mas ainda assim faltou ver um pouco mais seu lado enquanto mãe e esposa, facetas inexploradas diante da importância de sua figura pública e política. Minha História é um documentário que possui seus méritos ao fortificar qualidades, mas que, metaforicamente falando, se esquece de avançar alguns passos para atravessar a cortina do palco.