Vivendo ou repetindo?
por Barbara DemerovDefinir Entre Realidades em uma única palavra é uma tarefa difícil, mas é justamente isso o que torna este filme tão interessante. Este não é um daqueles casos em que a falta de completo entendimento transforma a experiência cinematográfica numa grande incógnita; afinal, a atuação de Alison Brie como a jovem Sarah é uma mistura de narradora não confiável com uma protagonista extremamente cativante e vívida, que nos transporta para seu mundo particular sem delongas. E também sem muitas explicações.
O roteiro co-escrito pela própria Brie e o diretor, Jeff Baena, viaja por entre diversos gêneros (comédia dramática, romance e até ficção-científica) para, só então, adentrar no gênero drama de uma forma tão sutil quanto profunda. Sutil porque a personagem, até o terceiro ato do filme, mostra ao espectador apenas o que deseja que ele veja; e profunda porque, na parte final, tudo é exposto sem desvios estéticos ou interrupções. Trata-se de um filme sobre colapso, perdas e desconhecimento de si próprio.
Ou... Entre Realidades é um filme sobre invasão alienígena, experimentos com humanos e a certeza de que existem diversas linhas do tempo existindo ao mesmo tempo em nossas vidas. E está tudo bem enxergar a história de uma forma ou de outra, porque a provável intenção da dupla de roteiristas seja a de mostrar as duas visões (a da protagonista e a de quem vê a história com certa distância) de uma forma natural, sem uma anulando a outra. A fotografia sempre colorida e a direção de arte que contorna bem os momentos em que tudo parece real ou irreal são dois pontos altos, mas o maior deles é a já citada atuação de Brie.
Tal escolha é a maior proeza deste filme original Netflix, que nunca excede seu tom utópico para buscar ser mais excêntrico ou enigmático. É interessante como todo o entorno de Sarah parece desmoronar aos poucos, mas suas convicções vão clareando ao passo que compreende a verdade. Ou a sua verdade. Alison Brie entrega camadas tão profundas à sua personagem que é difícil identificar o que ela poderia estar pensando em momentos simples: seja quando visita o cavalo que considera seu ou quando conhece uma pessoa interessante (talvez pela primeira vez na vida).
A verdade é que não conhecemos o passado de Sarah ou o quê exatamente aconteceu com sua mãe e avó, mas a característica mais importante inserida em Entre Realidades é a pura e simples demonstração de empatia - seja por parte do terapeuta que ouve Sarah próximo ao desfecho ou por parte do espectador. Para nós pode parecer que o que a protagonista está vivenciando é um delírio psicológico, mas a temática existencial contida em sua narrativa é extremamente válida para quem olha de fora. Entre Realidades pode não saber exatamente que tipo de filme é, mas tal característica combina com Sarah. Neste caso específico, é na ambiguidade que reside a maior das respostas.