Emoção à flor da pele
por Barbara DemerovÉ difícil afirmar que Milagre na Cela 7 não gera comoção. Talvez o mais correto a se dizer é que este drama apresenta tudo em graus extremamente elevados, incluindo a sentimentalidade. Afinal, ela vem de seu protagonista, sua filha e todos aqueles que o cercam na pacata cidade turca onde vive. A carga dramática também está na trilha-sonora sempre presente, no uso da câmera que utiliza muitos planos em câmera lenta e nas cores vivas ao ar livre ou em ambientes fechados. A emoção que o filme quer trazer está sempre ali, à espreita, esperando para alcançar o espectador. Porém, não é isso o que acaba acontecendo.
A questão que impossibilita Milagre na Cela 7 de se tornar um filme verdadeiramente emocionante é essa: ele busca se encaixar neste perfil a todo o momento e insere todos os tipos de clichês (alguns já citados) para atingir a tentativa. Enquanto isso, o roteiro nunca se aprofunda na história de Memo (Aras Bulut Iynemli), um homem que sofre de problemas mentais e que apenas quer ficar ao lado da filha. Para a história se desenrolar, basta sabermos que, ao contrário do que alguns acham, ele é inocente e não teve absolutamente nenhuma culpa com relação à morte de uma garota da comunidade. Mas, a fim de construir o conflito, essa garota acaba por ser filha de um rigoroso general que apenas deseja vingança.
Roteiro prioriza a emoção a qualquer custo
Apoiando-se em situações e cenários convenientes demais para que sintamos dó de Memo o tempo todo, o longa de Mehmet Ada Öztekin peca por não saber como se afastar de um tom infeliz que vai perdendo sua força ao longo do tempo. Na prisão, é bonito ver como os companheiros de cela de Memo se compadecem com sua história e a pouca capacidade de se defender, mas todas as cenas tornam-se repetitivas a partir do ponto em que todos ali passam a querer ajudá-lo. Todos aqueles homens, assim como o protagonista, carecem de um desenvolvimento menos artificial e acabam por se abreviar em estereótipos comuns, por mais consistentes que sejam suas atuações - em especial a de Aras Bulut Iynemli na pele de Memo.
A narrativa de Milagre na Cela 7 vagueia entre o conforto de se sustentar na figura de Memo, que cativa sem muitas dificuldades, e a bondade de absolutamente todos ao seu redor (exceto pelo general, o grande vilão). Essa escolha não é incômoda, mas simultaneamente prejudica uma imersão mais profunda na mente daquele homem. O amor que Memo sente pela filha Ova (Nisa Sofiya Aksongur) é belíssimo de se contemplar, mas pouco sabemos sobre como ele a criou ou como era a relação de ambos quando a menina era mais nova. O carinho que vemos em tela mais se parece com um sentimento de irmãos, não de pai e filha.
Por isso, a perspectiva que temos durante o filme é aquela que prioriza a visão dos personagens para com Memo, e não a de Memo para com o mundo. Isso pode parecer pouco, mas é importante e faria extrema diferença caso víssemos o contrário - por exemplo, numa relação paternal melhor estruturada. Milagre na Cela 7 é, sim, um filme que toca em temas sensíveis e humanos: a intolerância com pessoas que são diferentes, a dificuldade em ouvir o outro e, também, a capacidade de evolução do ser humano para alcançar o auto-perdão. Porém, por se prender às saídas mais fáceis e soluções convenientes, o filme perde força enquanto cinema para entregar uma mensagem de superação no final já conhecida por todos.