Na natureza selvagem
por Barbara DemerovA vastidão da natureza, assim como a singularidade de uma história familiar que flerta bastante com o autoconhecimento de sua protagonista, é reproduzida com forte ligação da ficção para com o que é orgânico em O Sussuro do Jaguar. Intenso e também contemplativo, o filme acaba entregando na serenidade motivos para encontrar impulso, e vice-versa.
Desde a fotografia, que expõe com excelência a beleza da Amazônia, até o roteiro composto por passagens bem pessoais de uma jovem que viaja a fim de encontrar o local ideal para as cinzas da irmã, o filme de Simon(é) Jaikiriuma Paetau e Thais Guisasola (que também protagoniza a história) não só entrega uma viagem complexa como também nos faz viajar dentro de nossa própria história como brasileiros. Além de inserir elementos que se complementam numa discussão política importante e atual como a questão de alimentos transgênicos, são apresentadas questões como preconceito, a modernização em espaços naturais que não necessitam de tecnologia, e por aí em diante.
A viagem de Ana (Guisasola) é importante por diversas óticas: tanto por apresentar a afetividade que tinha com a irmã quanto por ser praticamente um rito de passagem para alguém que passará a enxergar o mundo com outros olhos após tal aventura. O encontro da jovem com diferentes pessoas se mistura com cenas em que a irmã dança em locais pelos quais ela passou e ainda passará, dando a sensação de que estão juntos, se conhecendo ainda mais. Como se estivesse escrevendo em um caderno, Ana vai pensando em voz alta e nos narrando, com suas reflexões, a importância de estar vivendo aquele momento. Por mais triste que seja ela estar viajando por conta da morte da irmã, é inevitável ver que ela sente certa felicidade por estar conhecendo tantos horizontes.
O fato de inserir personagens que não são atores, mas sim pessoas comuns que por um acaso estavam ali no momento em que a equipe do filme passava, torna toda a experiência de O Sussurro do Jaguar bem imersiva e especial. Isto também só comprova que histórias mais particulares podem, sim, tocar o público se estas forem bem articuladas a ponto de entregar um panorama atual, que dialogue com questões contemporâneas e, sobretudo, humanas.
Seja conversando com moradores em pequenas cidades, pegando carona com estranhos ou até mesmo participando de uma orgia com o pôr-do-sol ao fundo, Ana vai se encontrando e mergulhando dentro de si mesma cada vez mais. Toda sua construção faz parte de algo muito maior e cabe apenas a ela levar adiante suas vivências. No silêncio das matas, elas falam muito mais alto que o barulho de um jet-ski.
Filme visto no 26º Festival Mix Brasil de Cultura da Diversidade, em novembro de 2018.