Críticas AdoroCinema
3,0
Legal
Uma Segunda Chance para Amar

Natal embalado a George Michael

por Laysa Zanetti

Quando tudo começa a dar estranhamente certo para o casal protagonizado por Emilia Clarke e Henry Golding, com muitas coincidências em jogo ao mesmo tempo, é natural que alguém eventualmente chegue à conclusão de que há algo de errado no desenvolvimento dessa história. Para Paul Feig, no entanto, nada é por acaso, e tudo fica claro quando Uma Segunda Chance para Amar eventualmente chega ao lugar em que pretendia chegar.

Tratando-se de uma comédia romântica natalina, Uma Segunda Chance para Amar não cai muito longe de uma árvore tipicamente conhecida, mas é charmoso quando pede ao espectador que suspenda algumas de suas crenças naturais para mergulhar nesta história, que tem origem em uma família Iugoslava que migra para o Reino Unido em busca de uma vida melhor. A inserção de um subtexto político serve de pretexto para que o Brexit e uma eventual reflexão sobre os radicalismos atuais se façam presentes no texto, ainda que isso não seja o gancho principal ou teça grandes interferências no contexto geral da história. É uma escolha que parece feita mais para que o longa tenha um gancho sócio-político pertinente do que algo que realmente se faz necessário.

Fora isso, é claro, todos os clichês estão lá: Emilia Clarke é a protagonista adorável e desastrada, Henry Golding é o interesse romântico aparentemente perfeito que está sempre disposto a entregar uma lição de vida na forma de uma metáfora, as locações são agradáveis aos olhos e repletas de pontos turísticos ingleses, enquanto a personagem coadjuvante está à disposição para entregar as tiradas cômicas com uma trama à parte propositalmente excêntrica.

Estes mesmos clichês — e não há nada de necessariamente errado com eles — são os pontos que conduzem boa parte da história. É isso que confere à comédia, ao menos nos seus dois primeiros atos, um ritmo confortável ao espectador, mesmo não sendo dos mais inéditos ou estando longe do que normalmente se esperaria de uma comédia romântica. Mais do que isso, no entanto, Uma Segunda Chance para Amar acerta em cheio ao escolher Emilia Clarke para interpretar Kate. Dificilmente a atriz vai conseguir se desvencilhar tão cedo da imagem de Mãe dos Dragões, que interpretou por oito temporadas em Game of Thrones, mas aqui ela reafirma a sua afinidade com comédias e torna-se facilmente o ponto alto da trama. É claro, ela traz mais do que apenas a própria graça — Kate esconde a olhos vistos uma dor e seus próprios problemas, e justamente a facilidade com que Clarke equilibra esses dois vieses faz dela a escolha ideal para o gênero.

É dessa forma que percebemos que Kate está escondendo muito de quem realmente é em uma fachada engraçada, atrevida e ácida. Todas as suas ambições, ainda que interessantes, acabam não recebendo a atenção que mereciam, mas há algo a se destacar positivamente aqui: Kate não está procurando por um amor para curá-la, e ainda que eventualmente pode até ser que ela encontre algo que a faça mudar e a transforme em uma pessoa melhor, isso não é necessariamente o seu grande objetivo, e muito menos é sua vontade ser transformada pelo amor de outra pessoa.

Mas à medida que Tom (Golding) surge com suas tentativas de transformar Kate, sempre com uma atitude ou uma frase de efeito totalmente adequada e coerente, é previsível que os espectadores, assim como o próprio filme, passem a especular se ele está tramando algo além. E, tendo em vista que o roteiro desenvolvido por Emma Thompson e Bryony Kimmings parte da canção “Last Christmas” de George Michael, é natural que esse questionamento aconteça. O grande problema é que a comédia acaba tratando o terceiro ato e todo o desenvolvimento do que poderia ser algo mais aprofundado como uma mera reflexão que não carece de mais profundidade e análise. As questões pertinentes da família de Kate e até mesmo de seus dramas pessoais, acabam vindo à tona muito tarde e sem tempo para surtirem um efeito maior. Isso é o que impede Uma Segunda Chance para Amar de causar um impacto mais forte, mas Emilia Clarke garante que todos os momentos mais complicados da personagem sejam entregues com a bravura necessária — e isso já é o suficiente.