Críticas AdoroCinema
2,0
Fraco
Juntos para Sempre

Cachorro é amor

por Bruno Carmelo

Assim como os diversos cachorrinhos presentes nesta história, Juntos para Sempre é um filme preocupadíssimo em agradar. Ele apresenta ao público o que supõe ser o máximo de beleza e virtude: cenários paradisíacos ao pôr do sol, música agradável, histórias de amor eterno, reconciliações familiares, animais fofos cuidando de crianças adoráveis. O bem vence o mal, as doenças se superam, e a morte, quando acontece, é logo superada pela perspectiva da reencarnação. Embora os nossos personagens sejam constantemente confrontados ao abandono, à doença e a fatalidade, o horizonte se mantém firmemente otimista.

O olhar idealizado constitui o elemento capaz de atrair alguns espectadores, enquanto afasta tantos outros. Para quem busca uma forma de escapismo leve, mesclando sorrisos e lágrimas, o drama cumpre as expectativas. Afinal, nenhuma das representações mais espinhosas da trama (o alcoolismo, a batalha contra o câncer, a baixa autoestima) soa próxima de uma psicologia verossímil. Entretanto, para aqueles que preferem o realismo, o resultado é uma história sem asperezas. Em sua linearidade inabalável de mortes e ressurreições, o projeto da diretora Gail Mancuso vende o mundo como ele poderia ser – uma versão reconfortante, fácil, onde conflitos se resolvem num passe de mágica.

A vertente fantástica, aliás, permite ao roteiro aprofundar seu discurso religioso. Embora não constitua uma obra abertamente cristã, Juntos para Sempre nunca esconde sua vertente pregadora, um tanto tradicionalista na ideia de que a única felicidade se encontra no casamento e na família patriarcal, enquanto as pessoas que fogem a esse sistema (a mãe de Clarity, o namorado Shane) se tornam vilões cartunescos. Além disso, o cachorro ganha ares de anjo da guarda, uma figura transcendental destinada a vigiar e cuidar dos seres humanos falhos. Em suas narrações em off, tão ingênuas quanto carinhosas, o cachorro defende que os indivíduos precisam de cachorro assim como precisam de amor. Em outro momento, o narrador sugere que é impossível ser feliz sem um cachorro. Segundo raciocínio, o cão não apenas traz amor: ele é a encarnação literal do amor incondicional.

A constante voz do cachorro produz a sensação de infantilidade. Mancuso trata o espectador como uma criança que desconhece a linguagem cinematográfica básica, precisando ser guiada sobre suas intenções e significados. Quando Ethan (Dennis Quaid) fica zangado em cena, o cachorro comenta: “Ethan estava zangado”. Depois, diante da tristeza de Clarity (Kathryn Prescott), o cão afirma que ela está triste. Os comentários possuem duas funções primordiais, ambas um tanto ingênuas: ou as falas tecem alguma piada sobre o ponto de vista de um cachorro a respeito da vida humana, ou repetem o que se vê em cena. Para algum espectador muito jovem, sem qualquer contato com o audiovisual, talvez a preocupação didática se justifique. Mas é difícil conceber, em pleno século XXI, algum espectador, jovem ou adulto, incapaz de compreender emoções básicas no rosto dos atores sem a ajuda da tradução simultânea de Bailey.

Ao menos, alguns elementos elevam a qualidade do projeto: a maneira orgânica como insere personagens asiáticos na trama, a figura de uma garotinha autônoma e esperta e a tentativa de inserir, ainda que de modo discreto, os desafios dos centros de acolhimento de animais de rua. Estes elementos esparsos contribuem a retirar Juntos para Sempre do ambiente fabular e inseri-lo numa sociedade palpável. De resto, sobra a representação um pouco simplória dos personagens, ou gentis ou malvados demais, destinados a fazer rir numa cena e chorar na próxima, dialogando sempre com as sensações mais epidérmicas ao invés da reflexão. Mancuso baseia-se em amor e ódio, nascimento e morte, juras de amor e frases de efeito para transformar sua ficção num panfleto moral.