As lembranças das atrizes
por Bruno CarmeloVocê conhece as primeiras experiências de Judi Dench ou Maggie Smith como atrizes? O estudo de artes dramáticas, os primeiros papéis conquistados? Para os cinéfilos mais novos, Dench, Smith, Eileen Atkins e Joan Plowright são conhecidas principalmente pela participação em grandes franquias (James Bond, Harry Potter) ou pelo respeito que a indústria mantém por cada uma delas, reverenciadas em entrevistas e premiações. Em outras palavras, as quatro são conhecidas como “veteranas das artes dramáticas”, “divas”, “as melhores de sua área”. Elas se tornaram ícones, imagens idealizadas.
No entanto, o diretor Roger Michell dá um passo atrás na tentativa de enxergá-las como atrizes quaisquer, sem o status normalmente associado aos seus nomes. Para isso, acompanha uma tarde de encontro entre as quatro amigas ao redor de uma mesa. Elas tomam chá, bebem champanhe, lembram os bons e maus momentos na carreira. O filme resume a sua estrutura inteira a esta reunião, sem se esforçar em criar outras interações para além da conversa despretensiosa, corriqueira. A produção parece ter sido filmada num único fim de semana, com pouquíssimos recursos. Michell se interessa visivelmente no potencial humano, e não estético.
Por um lado, o resultado apresenta um despojamento sedutor. A intimidade entre as protagonistas permite que brinquem umas com as outras sem pudores, recordando os papéis perdidos, as inseguranças, a evolução técnica, as dificuldades, o machismo encontrados. De modo orgânico, elas citam a pressão para serem sempre belas, jovens, desejáveis, numa indústria ainda controlada por homens. Apesar de terem mais de 80 anos de idade, dizem que pretendem atuar enquanto lhe oferecerem papéis, e rechaçam o paternalismo dos mais jovens.
Dench, Smith, Plowright e Atkins discorrem tanto sobre a juventude quanto sobre a morte em tom divertido, com direito às tiradas sarcásticas de Smith e às anedotas impagáveis de Dench. Esta última relembra longos trechos de diálogos encenados há décadas, enquanto Plowright relembra a dificuldade de seu casamento com Laurence Olivier. O diretor, muito próximo delas, lança temas, instiga memórias, porém, depois se cala, observando-as com admiração. Este constitui o movimento do filme como um todo: o prazer de reunir pessoas interessantes e divertidas, vendo-as discutirem, absorvendo quaisquer histórias que tenham para contar, sem hierarquia de época, nem temática. As lembranças seguem a lógica fluida e aleatória da memória afetiva.
Por outro lado, a pequenez do projeto não esconde um tratamento deficiente da imagem. A câmera treme incessantemente até encontrar seu enquadramento, perdendo o foco no meio de um depoimento. O som está bastante desnivelado, com vozes agudas e sibiladas, demonstrando problemas tanto na captação de som direto quanto na edição e mixagem. Para um diretor acostumado a projetos grandes como Um Lugar Chamado Notting Hill e Um Final de Semana em Hyde Park, o descuido com a estética é surpreendente. Pelo menos, o uso de raros materiais de arquivo permite ilustrar as histórias contadas pelo quarteto sobre suas encenações gloriosas ou traumáticas.
Michell tenta disfarçar o amadorismo da captação através da humildade metalinguística: ele revela a presença da câmera, as poucas luzes, a equipe reduzida, e inclui na versão final a reclamação das atrizes sofre um enquadramento ou a presença invasiva de um fotógrafo still. Por ocupar um espaço íntimo, o cineasta permite ver os bastidores como espécie de mea culpa. Ao menos, em sua simplicidade, consegue transmitir um discurso nada ingênuo sobre a dificuldade do ramo de ator, com todas as pressões financeiras e sociais associadas ao trabalho artístico, desde os anos 1950 até hoje.
Se este aspecto constituísse o tema central, talvez o resultado ficasse mais engessado, protocolar. Mas Chá com as Damas jamais perde o bom humor, funcionando como pequeno documento sobre a transformação de atrizes comuns em ídolos, tão amados quanto postos à distância dos fãs. Enquanto aborda a consagração institucional das quatro, incluindo o momento em que foram nomeadas Damas pelo reino da Inglaterra, o documentário efetua o processo contrário, de aproximação e humanização das figuras por trás das maquiagens, figurinos e prêmios.