A Morte do Superman: Crítica AdoroCinema

As comemorações pelo aniversário do Superman visam resgatar um personagem singular dentro do universo de super-heróis. Na época em que os novos salvadores podem ser atrapalhados e moralmente questionáveis, o Superman (ou Super-Homem, como era chamado ainda há pouco) reúne um conjunto inabalável de virtudes: ele é forte, sério, impecável na tarefa de esconder seu alter-ago, e sempre disposto a resgatar criancinhas em perigo e donzelas indefesas, enquanto profere frases de efeito que sirvam de lição aos vilões.

Estes tempos maniqueístas, de menor complexidade psicológica, são resgatados em sua estrutura original no longa-metragem de 2018. Não é de se espantar que a narrativa constitua basicamente uma alternância entre grandes cenas de luta (desde o começo até a esperada batalha final) e de dramas pessoais, com destaque para a dificuldade em revelar sua identidade à amada Lois Lane. Ainda que o Flash sirva como um bem-vindo alívio cômico, A Morte do Superman é uma obra sisuda, clássica em termos de animação e tradicional em seus rumos narrativos. Quando Doomsday aparece para confrontar o herói, a batalha se limita a uma longa sucessão de socos e poderes.

O melhor momento do filme dirigido por Sam Liu e Jake Castorena se encontra na morte do protagonista, prometida desde o título. Os fãs dos quadrinhos devem ficar particularmente satisfeitos com o tom solene, o uso expressivo de música e a variação de enquadramentos para representar a gravidade da morte de um dos maiores ícones da DC. O longa-metragem inteiro se constrói como uma preparação para este momento-chave, no qual a decadência de um símbolo é tratada com a devida empatia e grandiosidade. O que vem antes disso, no entanto, funciona como mera antessala para o clímax.

Esteticamente, A Morte do Superman não empolga muito. O trabalho de fotografia é limitado: as luzes sem volume achatam os personagens contra o fundo, o que funciona bem nos quadrinhos, mas não tanto no cinema. A construção de som direto é praticamente inexistente: quando os personagens saem na rua de uma cidade grande como Metrópoles, escutamos apenas a voz clara dos personagens e os acordes da trilha sonora, sem o trabalho de ruídos, vozes distantes ou outros tons sonoros fundamentais para a construção de um ambiente verossímil. Quanto ao protagonista, sua rigidez moral se coincide com a rigidez do corpo, tenso como uma estátua. Novamente, apenas Flash consegue sugerir alguma leveza na construção dos corpos e gestos.

Talvez o principal valor deste projeto seja extrafílmico: ele funciona como resgate de um tipo de narrativa de décadas atrás, que pode se comunicar com a nostalgia dos fãs, enquanto serve para estabelecer a distância entre estas histórias de antes e aquelas produzidas nos nossos dias. No século XXI, mesmo o Homem de Aço de Zack Snyder se permite alguns toques de humor aqui e ali, e a reunião da Liga da Justiça salienta o confronto de acertos e erros nas decisões dos heróis. Hoje, o público precisa encontrar certa humanidade nos super-heróis para se identificar com eles, ao contrário de algumas décadas atrás, quando a idealização era o objetivo procurado. Este filme de 2018 surge como curiosa ponte entre dois mundos, e duas formas de representação: ele constitui uma obra dos nossos tempos, munido de uma visão de mundo de décadas atrás.