Estereótipos indecentes
por Barbara DemerovUm filme dentro de um filme. Quantas histórias já não assistimos que reproduzem essa ideia exata? Há diversas delas, mas nem todas são centradas na criação de um pornô que envolve um diretor de cinema que hoje se tornou padre, uma atriz pornô brasileira chamada Ashley Cummings, um casamento prestes a ser realizado e um dono de locadora que pouco se importa com o enredo dos filmes deste gênero, apenas com sexo explícito em cena.
No entanto, para o diretor Victor, cinéfilo que só havia produzido curtas-metragens com a noiva até então, até mesmo um pornô tem a capacidade de se tornar um clássico - se feito com a mentalidade de inserir uma história convincente acima do sexo. Em Pornô para Iniciantes, a ideia de criar um A Noiva de Frankenstein da indústria pornográfica começa de forma muito interessante e, sobretudo, divertida, mas o desenvolvimento do protagonista o torna tão inconveniente e egoísta que é difícil torcer para que seu desafio seja executado com sucesso. Por mais que seu "Pornostein" seja feito com dedicação, o mesmo não pode dizer de sua dedicação para outras áreas de sua vida, com o por exemplo: o próprio casamento.
Com uma série de clichês que vão sendo apresentados aos poucos, o filme transita entre a possibilidade de ser uma comédia que cativa pelo clima de erros e uma comédia apenas superficial. A atriz brasileira acaba sendo uma paixão sem limites para o diretor, que atropela a própria intenção de fazer o filme para conquistá-la (inclusive mudando o cronograma de filmagem das cenas de sexo por puro ciúme e sentimento de posse pela mulher). A noiva de Victor, que sempre o apoiou ao ser atriz em todos os seus curtas, passa a ser resumida como uma pedra no sapato - assim como seu sogro, que possui dinheiro e sempre ajudou o casal a garantir uma vida confortável. Não é possível ver maldade no sogro por ele simplesmente querer ajudar o genro, mas Victor, desde o princípio, tem a intenção de colocar o máximo de dinheiro na mesa a fim de garantir respeito e alimentar o ego.
Ashley, apesar de falar abertamente o quanto é entendida em diversos assuntos (ela insinua uma visão tão interessante sobre o personagem Pornostein que assusta o próprio diretor), é claramente diminuída ao que sua profissão "representa" aos olhos de homens que só pensam no desejo carnal. O próprio Victor se apaixona puramente por uma atração física, e não pelo seu intelecto - que até chega a ser delineado no decorrer do filme, mas se perde dentro da visão egocêntrica do protagonista. O estilo e a presença marcante da atriz não falam mais alto que a falta de profundidade à sua essência.
Outros personagens vão e vem na trama como simples muletas do roteiro para que o mesmo possa seguir da forma que Victor quer - como é o caso de Aníbal, amigo/dono de locadora que tem como única intenção ser o alívio cômico. Pornô para Iniciantes começa de forma metalinguística e com símbolos muito promissores (como na cena em que Victor, no presente e como padre, entra no confessionário para ouvir um jovem e acaba sendo aquele que confessa os próprios erros); contudo, a condução descuidada da história a faz entrar num círculo de atitudes machistas e interesseiras de modo abrupto. Fora a ótima fotografia e montagem, que raramente perde o ritmo, a ligação para com um universo tão atrativo se torna apenas um centro de estereótipos.
Filme visto no 14º Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo, em julho de 2019.