Por amor ao jogo
por Francisco RussoTão certo quanto afirmar que o brasileiro é apaixonado por futebol é dizer que, nos Estados Unidos, o basquete é o esporte nacional. Basta notar a quantidade de quadras espalhadas país afora, em inúmeros bairros e cidadelas, o que possibilita o surgimento de um sem-número de talentos, ano após ano. Tio Drew é mais um filme que busca explorar esta paixão, a partir de duas vertentes: a presença de ídolos do esporte e a cultura em torno dele.
No primeiro aspecto, o filme até agrada devido a um truque que pode passar despercebido: tanto o personagem-título quanto seus colegas de time são, todos, ex-jogadores de basquete consagrados embaixo de muita maquiagem. Por mais que o filme não anuncie de imediato - há cenas de bastidores nos créditos finais que escancaram tal transformação -, tal proposta não só permite as jogadas acrobáticas da trupe como, também, serve com um baita chamariz aos fãs, que têm a rara chance de vê-los atuando - e até bem, dentro do contexto apresentado.
Já a cultura em torno do esporte surge especialmente na história aqui contada: um lendário jogador, com ares de mestre sábio, ressurge em uma reles quadra de rua. Veterano, ele dá uma lição a um punhado de jovens que não respeitam o jogo como se deve, ensinando-lhes a importância do jogo mental. Soma-se a isto um técnico sem sorte, que vê sua vida desmoronar quando perde os jogadores de sua equipe amadora, às vésperas de um tradicional torneio de basquete de rua.
A chave da mensagem a ser transmitida está na escolha pelo basquete de rua, ao invés da consagrada NBA: Tio Drew não quer falar dos astros milionários, mas da paixão pelo jogo que vem das ruas, exercida por anônimos dia após dia. Não por acaso, seus dois protagonistas são renegados: um grande jogador que não alcançou a fama merecida devido a um erro do passado, um técnico que precisa superar um trauma de infância. Assim como em vários outros filmes de esporte, a redenção e a superação estão na mira.
Apesar de tal contexto, Tio Drew falha (bastante) em um detalhe crucial que deveria impulsionar a narrativa: os coadjuvantes. Com vilões irritantemente caricatos, o filme logo apela para uma sucessão de clichês infantis envolvendo provocações gratuitas, muitas dignas de jardim de infância. É apenas quando o filme assume o tom de road movie que tudo melhora, muito devido ao carisma dos jogadores travestidos e a algumas peculiaridades em relação ao reencontro - a dinâmica entre Preacher e Betty Lou, interpretados respectivamente por Chris Webber e Lisa Leslie, funciona bem. Ainda assim, o humor retratado nunca cativa de fato, no máximo arrancando breves sorrisos - com exceção da ótima citação a Corra!
Soma-se a isto a canhestra maquiagem utilizada, digna dos piores filmes estrelados por Eddie Murphy, que sequer tenta enganar em relação à idade do elenco. No fim das contas, o foco não é entregar um filme bem acabado, mas algo que sirva de escada para explorar o fetiche em ver os ídolos do esporte em cena. Simples assim.
Bastante irregular e com poucos bons momentos, Tio Drew apenas diverte de fato em seus minutos iniciais, com uma bem-humorada montagem documental envolvendo a lenda em torno do personagem-título, e as tais cenas de bastidores, exibidas durante os créditos finais. No meio destes extremos, resta um filme simplório que apela a muitos clichês para, uma vez mais, beber da fonte do amor ao jogo, tão intrínseco quanto conveniente a qualquer filme esportivo.