Ser ou não ser?
por Barbara DemerovJá há algum tempo virou senso comum a ideia de que um ator de comédia precisa, em algum momento, experimentar um papel dramático para poder "provar seu valor". A indicação ao Oscar deste ano conquistada por Melissa McCarthy por Poderia Me Perdoar? é apenas o exemplo mais recente de uma lista que tem nomes como Robin Williams, Jim Carrey, Adam Sandler e tantos outros.
A quem espera que Chorar de Rir seja a vez do brasileiro Leandro Hassum entrar para esse time, convém repensar - pelo menos por enquanto. Isso porque o filme ainda é predominantemente calcado no humor, principalmente o físico, especialidade do protagonista, e está longe de permitir um aprofundamento dramático mais profundo. A tal dualidade entre comédia e drama fica reduzida mais a uma briga de egos do que a qualquer outra coisa.
É fato que a história gira em torno de um humorista em crise e desafiando-se a respirar novos ares, mas esta é uma premissa que o longa nunca parece comprar totalmente. Os esforços de Nilo Perequê (Hassum) para realizar sua almejada montagem de Hamlet - que, em sua cabeça, enfim traria reconhecimento como artista sério - descambam sempre para a comédia. A motivação do personagem é trabalhada mais como uma necessidade de ser respeitado pelas pessoas do meio do que um desejo íntimo.
As situações dramáticas, como a própria crise profissional do personagem principal, se resolvem de maneira superficial. Não há tempo suficiente para desenvolver o relacionamento de Nilo com Barbara (Monique Alfradique), sua antiga paixão que reaparece tão famosa quanto ele, e nem de acreditar em seu talento no drama, uma vez que o filme dá esse twist de modo tão repentino e mal o vemos exercitar esse outro lado antes de subir ao palco.
O roteiro de Chorar de Rir utiliza elementos clássicos do gênero, como o feitiço que o impede de falar algo sem fazer piada, expediente bastante similar ao utilizado, por exemplo, em O Candidato Honesto, também estrelado pelo astro brasileiro. Há também o uso da música Despacito, um dos hits contemporâneos mais animados, em uma versão mais "refinada", mas que torna-se risível devido a insistência de suas repetições.
Como a cena final mostra muito bem, Chorar de Rir faz uma bela uma homenagem aos diferentes tipos de humor (da breve participação de Sergio Mallandro ao programa Choque de Cultura, com a presença de Caíto Mainier), o que é válido, mas o efeito de misturar tudo isso resulta numa obra que não tem brilho próprio, como uma colcha de retalhos que ainda não passou pelo toque final.