Críticas AdoroCinema
2,5
Regular
Os Farofeiros

Feriadão frustrado

por Taiani Mendes

Nova comédia com potencial para arrecadar enorme quantia nas bilheterias nacionais, Os Farofeiros é um filme que se esforça para entregar mais do que a esperada comédia de situação sobre um fim de semana marcado por imprevistos e desacordos. O diretor Roberto Santucci já provou com Até que a Sorte nos SepareDe Pernas Pro ArUm Suburbano Sortudo sua capacidade de fazer rir (tanto os pagantes, quanto os exibidores e investidores) e agora quer ir além, evoluindo a fórmula de sucesso que afirmou. Isto é posto desde o começo, numa sala de aula, com o estabelecimento de uma criança como dona da narrativa. Através da clássica redação de férias, é o filho de Alexandre (Antônio Fragoso) quem conta os apuros do feriadão em grupo heterogêneo, destacando a tensão profissional presente.

Os típicos perrengues de descanso prolongado dividindo casa com estranhos surpreendentemente não se revelam as principais questões. Alexandre, o mais rico e oprimido dos adultos, acaba de ser secretamente promovido e precisa escolher um dos colegas para ser demitido. Há, portanto, o dilema interno desse protagonista com o segredo e a decisão, e os problemas gerais da viagem mal planejada por Lima (Maurício Manfrini), o malandro palhaço da trupe. Ancorado numa estrutura com início, meio e fim, o conflito mais sério segura o filme, ao passo que as confusões de verão são apresentadas como esquetes desconexas e irregulares – a estrada, a praia, a traição, o buraco (o melhor), a piscina, o réveillon...

O humor pouco exigente mira em variados tipos e gostos, de escatologia a referências televisivas; do nome Enzo a racismo; de violência a tombos; de traquinagem a afetação; de bobeira a muita bobeira. Lima é basicamente o irmão gêmeo do personagem mais famoso de Manfrini, o Paulinho Gogó, perseguindo o riso com erros de português, gracinhas sexuais e uma lógica absurda. Sua mulher é Jussara (Cacau Protásio, maior destaque do elenco), que não hesita em estapeá-lo ou aos filhos inquietos, não tem paciência nenhuma e nutre uma rixa com Renata (Danielle Winits), a esnobe esposa de Alexandre. Representando a dondoca neurótica, esta basicamente GRITA, reclama e fuma cigarro eletrônico.

Rocha (Charles Paraventi) e Vanete (Elisa Pinheiro) são a classe média insossa e escorregadia, Diguinho (Nilton Bicudo) é o melancólico invejado e sua acompanhante Elen (Aline Riscado) repete e desconstrói a Verão dos comerciais de cerveja. Numa compensação à objetificação feminina, surge ainda um faz-tudo com ridículo sotaque caipira vivido por Felipe Roque, demonstrando que há certa consciência de que estamos em 2018 e algumas coisas já não passam de forma alguma pelo filtro da problematização, mesmo no contexto da comédia popularesca.

Obviamente inspirado em Férias Frustradas e no humor hollywoodiano da década de 1980, Os Farofeiros apresenta uma série de citações e referências a obras como Apocalypse Now, O Chamado, Vidas Secas, O Resgate do Soldado RyanCinema Paradiso e Minha Mãe é uma Peça. As ideias, no entanto, não são tão bem executadas pelo diretor, que perde o timing arrastando demais as cenas ou adotando soluções de gosto duvidoso, como as crianças brilhando no escuro. É inegável, porém, que o repertório audiovisual apresentado é mais amplo do que o de suas produções cômicas anteriores, com direito a trechos em animação, fotografia que foge vez ou outra do padrão novela, quebra de quarta parede e metalinguagem, como uma longa sequência sobre a relação de amor e ódio dos brasileiros com o cinema nacional.

A noção de tempo durante os acontecimentos é um tanto quanto esquisita, dramáticas picadas de mosquitos desaparecem em minutos, o onisciente e assumidamente exagerado narrador é esquecido, Maurício Manfrini não se entende muito bem com a câmera cinematográfica e as pontas soltas do roteiro de Paulo Cursino e Odete Damico são inúmeras, assim como os motivos para sorrisos de constrangimento, mas este é sem dúvidas o melhor filme de Santucci desde Loucas Pra Casar.

Os Farofeiros acaba em muito se assemelhando a uma ponte, reunindo situações verossímeis em que o público facilmente se reconhece e propondo um diálogo dessa realidade com o cinema mais clássico, a arte de verdade e qualidade que as esterilizadas comédias Globo Filmes em geral parecem ignorar. A harmonia, “moral” também da história, é meio desajeitada, porém ao menos é buscada, como uma ambicionada e promissora nova alma do (lucrativo) negócio.