Críticas AdoroCinema
2,5
Regular
A Mulher na Janela

Uma bagunça narrativa

por Bruno Botelho

O cineasta Alfred Hitchcock é considerado o mestre do suspense e um dos melhores diretores do cinema de todos os tempos por causa de clássicos marcantes como Um Corpo que Cai (1958) e Psicose (1960), que influenciam até hoje diversas obras e autores. A Mulher na Janela é um dos filhos de Hitchock, um suspense psicológico fortemente influenciado por Janela Indiscreta (1954), mas que não consegue apresentar identidade própria por causa de uma narrativa bagunçada.

A Mulher na Janela é adaptação do livro de mesmo nome de A. J. Finn e segue Anna Fox (Amy Adams), uma alcoólatra reclusa que passa os dias em seu apartamento em Nova York, assistindo a filmes antigos e observando seus vizinhos. Quando a família Russell se muda para o prédio da frente, ela passa a espionar o que seria a família perfeita, até testemunhar uma cena chocante que muda sua vida.

A Mulher na Janela tem problemas graves no desenvolvimento da trama e seus personagens

A personagem de Amy Adams, Anna Fox, sofre de agorafobia – um tipo de transtorno de ansiedade em que a pessoa tem medo e evita lugares ou situações que podem causar pânico. Por isso, ela passa o dia em seu apartamento bebendo vinho, assistindo a filmes antigos e, obviamente, espionando seus vizinhos para passar o tempo. Logo de cara, percebemos um problema que seria notado ao longo do suspense: o ritmo acelerado e desenvolvimento raso dos personagens principais e suas motivações.

O livro de A. J. Finn é notável pelo seu ritmo lento e denso, que é fundamental para se aprofundar no psicológico conturbado da personagem principal. O roteiro adaptado de Tracy Letts e a direção de Joe Wright começam a produção contextualizando a vida dessa mulher solitária e mirando o suspense psicológico, mas logo se perde pela pressa em apresentar a trama principal – o que acaba atrapalhando a relação do público com a Anna Fox e a sensação de paranoia, que seria importante para suas pretenções. 

Ao invés de explorar com calma o cotidiano solitário de Anna e sua condição psicológica, A Mulher na Janela entra rapidamente na trama da família Russel e, principalmente, o assassinato que ela testemunha e é o primeiro ponto de virada do filme. Assim, a produção fica muito simplória e superficial, voltada mais para reverenciar filmes clássicos, quando poderia se destacar pela narrativa psicológica. Vemos pinceladas de Charlie Kaufman, com Estou Pensando em Acabar com Tudo, e Alfred Hitchcock, com Janela Indiscreta, mas Joe Wright não tem um controle da história como os cineastas citados e coloca elementos de forma abrupta.

A ideia principal é a que o público questione constantemente o que está acontecendo e se o que Anna está vendo é real ou imaginação, afinal, ela é não é uma personagem principal totalmente confiável. Mas esse caos mental nunca é aproveitado de maneira positiva e o público apenas presencia os acontecimentos surgindo de forma apressada. Assim, por mais que seus acontecimentos sejam intrigantes, isso vira uma grande bagunça, principalmente, pelas diversas reviravoltas presentes em A Mulher na Janela.

A grande explicação disso fica evidente quando olhamos para os bastidores da produção. O filme passou por refilmagens após reações confusas do público em exibições testes e sofreu adiamentos por causa da pandemia. Tudo isso reflete nitidamente no resultado final, com a falta de coesão e desenvolvimento superficial da história.

Amy Adams é o grande ponto positivo de A Mulher na Janela

O melhor de A Mulher na Janela é Amy Adams, que é uma das atrizes mais talentosas de Hollywood. Ela consegue passar bem para o público as nuances psicológicas e confusão mental de Anna Fox, ainda que o roteiro não contribua para um desevolvimento mais denso de sua personalidade. Ela brilha especialmente quando está em cena sendo confrontada por um grupo de personagens. Por falar neles, o elenco do filme está repleto de grandes atores, mas todos são mal aproveitados e subdesenvolvidos.

Temos Gary Oldman (Alistair Russell), Julianne Moore e Jennifer Jason Leigh (ambas como Jane Russell) e Fred Hechinger (Ethan Russell), formando a família Russell; Wyatt Russell como seu inquilino David; Brian Tyree Henry como o Detetive Little e, ainda, Anthony Mackie como Ed, o ex-marido de Anna. Todos eles sofrem com um desenvolvimento raso do roteiro, que não explora suas motivações. Com isso, o pior exemplo é o do personagem Ethan, que tem um papel importante no final, mas tudo é colocado de maneira pouco convincente e sem contextualização, atrapalhando gravemente a resolução da trama como um todo.

Apesar de toda a bagunça, Joe Wright consegue explorar bem a ambientação do apartamento de Anna e sua estética com o diretor de fotografia Bruno Delbonnel, proporcionando bons momentos de angústia e claustrofobia, além de cenas de suspense intrigantes que vão manter o público atento. Uma pena que até mesmo o talentoso compositor Danny Elfman parece ter sofrido na execução de suas ideias, pois sua trilha sonora nunca encaixa completamente no ritmo do filme e não consegue passar a ideia de ameaça constante. 

A Mulher na Janela é um suspense intrigante, mas bastante problemático. Ele sofre com uma narrativa confusa e bagunçada, que nunca consegue desenvolver bem a história e seus personagens principais de forma profunda. Apesar disso, Amy Adams se prova mais uma vez como um dos grandes talentos da atualidade, mantendo o público preso graças a sua atuação carregada de emoções.