Obsessão do pênis
por Bruno CarmeloUm garoto pede à namorada para fazer sexo oral nele. Ela recusa, diz que não tem vontade. Ele insiste, argumenta que todo casal normal faz isso, que seria uma prova de amor, que senão ele poderia trai-la com outra menina, porque tem suas necessidades de homem. Esta conversa poderia ocupar alguns segundos mas, no caso deste filme, dura 100 minutos. Sextape gira inteiramente em torno da dúvida entre fazer ou não fazer, ceder ou recusar, no caso muito específico do sexo oral, entre adolescentes franceses de origem magrebina, com as mulheres praticando nos homens, e não o contrário.
O foco é surpreendentemente limitado. Com apenas quatro personagens, o roteiro faz com que conversem da primeira à última cena ou, na maior parte do tempo, que gritem uns com os outros, inclusive durante o sexo. Rim (Inas Chanti), Yasmina (Souad Arsane), o namorado da primeira, Majid (Mehdi Dahmane) e o interesse romântico da segunda, Salim (Sidi Mejai) se manipulam, se chantageiam, pedem ajuda uns aos outros para conquistarem o único objetivo: serem “chupados”, em suas próprias palavras. Estamos um grau de libertinagem acima de American Pie, mas vários níveis abaixo de qualquer representação verossímil da sexualidade juvenil. Como de costume, quando a imagem do sexo se pretende cômica e popular, ela termina se infantilizando.
O início, entretanto, se anuncia promissor. Os quatro jovens conversam de maneira espontânea, usando termos chulos com bom humor. Enquanto isso a câmera na mão, pulando de um rosto para outro, transmite a impressão de despojamento e mesmo amadorismo, devido à iluminação fraca e captação de som deficiente. No entanto, a porta de entrada para a crônica sobre a juventude ou sobre a sexualidade feminina em meio conservador é freada pela narrativa. O motor de uma gravação sexual, sugerido no título internacional, funciona em partes como instrumento de tensão, mas nem o diretor nem os atores parecem levá-la a sério, esquecendo o conflito quando convém. O real motivo é de ordem psicológica, entre repressão e liberação.
A história baseia-se na premissa machista de que “o papel do homem é tentar, e o da mulher, recusar”, instaurando um jogo para ver quem vence. A suposta crítica por trás deste discurso se revela limitada, já que o diretor Antoine Desrosières faz questão de dividir o ponto de vista entre as duas garotas e os dois garotos, sem tomar partido. Caso se posicionasse claramente a favor delas, poderia oferecer alguma novidade no que diz respeito à autonomia feminina. Mas Sextape limita-se ao mea culpa rumo ao final, sugerindo que as mulheres podem, sim, fazer o que quiserem, com quem quiserem.
No entanto, falta ao cineasta um posicionamento inequívoco sobre seu tema, além de maior cuidado com a fotografia e o ritmo – a sucessão de diálogos gritados, sem respiro entre uma frase e outra, beira o insuportável. Se estiver buscando a radicalidade, que a adote a fundo, tanto na forma quanto no conteúdo. Mas o filme permanece preso entre a aparente subversão de ter garotas muçulmanas falando sobre “chupar paus” e a necessidade de preservar o feel good movie. Em outras palavras, ele se passa por um produto cool, mas não esconde o receio de incomodar quem quer que seja.
Filme visto no 71º Festival Internacional de Cannes, em maio de 2018.