Remake com sérias restrições orçamentárias
por Francisco RussoQuando a comédia mexicana Não Aceitamos Devoluções estreou nos cinemas nacionais, em 2014, a crítica do AdoroCinema já anunciava: "não seria surpresa alguma se, futuramente, esta mesma história fosse refilmada por alguma produtora brazuca". Quatro anos depois, é exatamente o que acontece em Não Se Aceitam Devoluções, versão local estrelada por Leandro Hassum, um dos reis da bilheteria tupiniquim.
Não era uma previsão difícil, convenhamos. O sucesso mexicano é o exemplar clássico de filme de apelo popular adaptável às mais variadas culturas, seja pelo tema familiar ou pela mescla entre comédia e drama - não por acaso, neste hiato de quatro anos ganhou versões na França (Uma Família de Dois) e na Turquia (Sen Benim HerSeyimsin). Em relação à história, a versão nacional não traz grandes mudanças: há uma variedade maior de personagens na fase brasileira, algumas simplificações nas subtramas do trecho americano, mas a essência está lá. Assim como no original, o foco está no mundo fantasioso criado entre pai e filha.
Após receber em casa um bebê sob a alegação de ser o pai, Juca Valente (Hassum) parte rumo aos Estados Unidos à procura da mãe. Lá, sem saber absolutamente nada de inglês, acaba salvando a pequena do afogamento, se atirando do alto de um prédio em uma piscina. É o suficiente para descolar um emprego de dublê, no mundo mágico do cinema em Los Angeles. Os anos passam, Juca e sua filhota ficam por lá, até que a mãe subitamente reaparece - o que muda radicalmente suas vidas, é claro.
A beleza da conexão entre pai e filha está na entrega de Juca à criança, não propriamente no sentido de sustentá-la mas pelo ambiente lúdico criado em torno dela - o apartamento com duas portas, uma adaptada à altura de Emma (Manuela Kfouri), é o melhor exemplo. O problema é que, nesta versão local, há uma fragilidade técnica impressionante. Da direção de arte ao figurino e maquiagem, o filme transpira a sensação constante de ter sido feito sob sérias restrições orçamentárias. Os efeitos especiais canhestros também não ajudam, assustando em sequências até mesmo simples, como o tal pulo na piscina - prejudicada, também, por uma montagem vergonhosa - e a participação sem sentido de um sósia de Ozzy Osbourne. Como resultado, o diretor André Moraes a todo instante opta por imagens em close, justamente na tentativa de disfarçar a pobreza visual que ronda todo e qualquer personagem.
Soma-se às limitações técnicas os problemas de roteiro, especialmente em relação aos diálogos, que exploram uma certa picardia brasileira controlada ao mesmo tempo em que denunciam, nas entrelinhas, o típico machismo latino. Basta acompanhar a quantidade de olhares tortos e piadas atravessadas em relação ao casal lésbico presente no filme, logo transformado em vilãs - isso, é bom ressaltar, também está presente no original mexicano, mas ausente do remake francês. Sem falar no histrionismo do elenco coadjuvante, do exageradíssimo Jarbas Homem de Melo ao insuportável personagem de Zéu Britto. Mesmo a jovem Manuela Kfouri não se destaca, incapaz de criar a química necessária para que se afeiçoe à personagem ou mesmo à relação familiar em torno de si.
Diante de tantos problemas, Leandro Hassum faz o que pode. Em um papel um pouco diferente de seu habitual, pelo privilégio à história em detrimento a um tipo pré-estabelecido, ele até se esforça em encontrar um balanço entre a comédia e o drama existentes na narrativa, por mais que volta e meia recorra aos seus cacoetes humorísticos. Entretanto, os problemas em torno de si são tão grandes que não há muito o que possa fazer.
Inferior ao original mexicano e ao remake francês - o melhor dos três, por sinal -, Não Se Aceitam Devoluções se vale de um mergulho na fantasia para tentar cativar o espectador a partir da relação entre pai e filha, na tentativa de rir e chorar. Se uma versão brasileira era esperada, surpreende que ela seja tão mal produzida ao ponto de influenciar tão negativamente o resultado final.