Críticas AdoroCinema
3,5
Bom
7 Desejos

O bom clichê

por Rodrigo Torres

Originalidade é uma questão complexa e até controversa em se tratando de cinema. Aos que acreditam em sua existência, há um consenso sobre a dificuldade de alcançá-la. Pois 7 Desejos mostra que explorar o velho com bom humor e cinismo pode ser uma alternativa bacana para o sucesso de um projeto. Assim, o filme de John R. Leonetti (Annabelle) realiza uma homenagem involuntária (?) ao mestre recém-falecido Wes Craven, haja vista o modo sagaz com que opera os clichês do suspense teen.

Diferente da franquia Pânico, porém, 7 Desejos não propõe uma discussão metalinguística sobre o gênero e suas convenções ao fazer paródia. A ironia é usada para questionar moralmente chavões que só existem no cinema devido à sua recorrência na sociedade. O ambiente de disputa na escola, sua subdivisão entre pessoas descoladas e deslocadas, a busca por popularidade, o uso indiscriminado das redes sociais (debate atual que tem sido abordado constantemente pelo gênero): todos esses subtemas são examinados com um olhar satírico que condena a futilidade do jovem americano.

Como em seu primeiro longa-metragem, Verdade ou Consequência, Barbara Marshall retrata o microcosmo adolescente feminino baseada em arquétipos. Se, por um lado, ela demonstra empatia e conhecimento desse universo ao conceber diálogos críveis, divertidos, nos momentos de discussão entre as garotas, a roteirista é impiedosa (o que aqui é ótimo) ao tratar seus anseios materiais e a cultura da imagem como uma verdadeira maldição. Assim, toda vez que Clare (Joey King) tem um pedido atendido, algum parente ou colega morre.

Portanto, pouco importa a condição de órfã e pobre da jovem. A morte de uma pessoa terá sempre peso maior que seus problemas, normais da vida. O corajoso roteiro agrava esse questionamento ético à própria protagonista quando seus pedidos se mostram superficiais, como fazer o cara mais popular da escola se apaixonar por ela, ou preconceituosos: impedir que seu pai (Ryan Phillippe, mais canastrão do que nunca) cate lixo. Se o cinema pende a uma abordagem simpática ou condescendente do loser7 Desejos toma a contramão fazendo questão de retratar sua personagem principal como pueril e egoísta.

Curiosamente, essa reflexão séria sobre o preço de uma vida acontece sob uma trama de suspense genérica, leve e engraçada. Em dado momento, a linda patricinha vivida por Josephine Langford começa a apodrecer — literalmente! — e seu amigo gay (este, sim, um estereótipo de gosto duvidoso), em vez de ajudar, faz cara de nojo, fotografa a situação e posta em suas redes, viralizando imediatamente. A deliciosa tragicomicidade de 7 Desejos se sustenta até um final trash maravilhoso, tão previsível que escancara a estupidez de Clare e ratifica a surpreendente ousadia do roteiro de Barbara Marshall.

John R. Leonetti também tem muito mérito na direção. 7 Desejos apresenta transições dinâmicas, travellings rigorosos e capricha na mise-en-scène de suas mortes macabras — outro clichê do subgênero teen explorado com escárnio, já que as próprias vítimas cometem erros banais que levam à sua tragédia. Uma conversa aparentemente despretensiosa sobre multiversos se torna reviravolta importante, funcional, que é referência direta ao trabalho anterior do cineasta em Efeito Borboleta 2. No clímax do filme, uma montagem caprichada acompanha duas possíveis mortes (o destino se manifesta em acidentes, como na franquia Premonição) em paralelo, provocando uma dilatação temporal que sustenta e prolonga a tensão apesar do desfecho esperado. Eis aqui um exemplo de montagem alternada eficiente, como não acontece numa produção recente infinitamente maior e dirigida por um cineasta mais cultuado: Dunkirk, do superestimado Christopher Nolan.

Ainda contemplado pelo carisma de Shannon Purser (a Barb de Stranger Things), que mais uma vez rouba a cena interpretando uma personagem comum que se destaca pela sensatez, 7 Desejos é a prova de que nenhum gênero precisa de pioneiros, tanta ambição, para manter seu vigor. Pode, em vez de criar susto fácil (gratuito, há apenas um durante o longa-metragem), se bastar como exercício de linguagem ou dialogar com outras escolas; seja fazendo uma crítica social descontraída, seja encenando um solo de sax com a cafonice de um clipe oitentista do Kenny G — o que não deixa de arrancar arrepios, além de risadas.