Críticas AdoroCinema
3,0
Legal
Eu Fico Loko

Diário de um adolescente

por Bruno Carmelo

Dez anos atrás, seria impensável o cinema dedicar uma cinebiografia a um jovem de 22 anos de idade com uma trajetória comum. Christian Figueiredo não é um grande esportista, nem uma celebridade do cinema. No entanto, o rapaz se insere no novo star system do século XXI: ele é um youtuber, ou influenciador, com milhões de seguidores em seu canal. Dialogando com o público adolescente, Christian fala sobre suas experiências na escola, sua relação com a família e com as meninas.

Na era dos ídolos cada vez mais jovens, uma trajetória como a de Christian se tornou o novo conto de fadas: teoricamente, qualquer jovem com um computador ou uma câmera na mão pode criar o seu canal, dizer o que pensa e ser seguido por outros jovens. Nem todos conquistam o mesmo sucesso, é claro, mas o protagonista deste projeto representa a democratização do estrelato: qualquer um poderia ser famoso, desejado e rico. Por trás da aparência de um experimento incomum dentro do cinema, Eu Fico Loko reforça a fábula da Gata Borralheira.

O diretor Bruno Garotti acerta ao evitar a linguagem do YouTube. O discurso fragmentado e barulhento dos jovens é substituído por uma abordagem cândida, de ritmo contemplativo e piadas inofensivas. O projeto está mais interessado em questionar o medo do primeiro beijo, da primeira transa e das primeiras brigas do que em fazer rir a qualquer custo. Neste sentido, o ator Filipe Bragança compõe um misto competente entre o perdedor e o rapaz potencialmente popular, sem pender para a caricatura de nenhum dos dois polos. A representação das meninas é louvável: poucas comédias nacionais ousariam criar uma personagem como Gabriela (Giovanna Grigio), de sexualidade despojada, sem ser punida por isso.

Nesta representação de um amadurecimento universal, a paixão de Christian pelo cinema e o desejo de romper a invisibilidade em relação a outros jovens contribuem à comunicação com o público adolescente. O diferencial da mensagem de Eu Fico Loko é a defesa de uma “loucura” delicada, espécie de autoafirmação da identidade: segundo o roteiro, não existe problema algum em a avó ser desbocada, a mãe crer em misticismos que ninguém mais entende ou o pai adotar uma postura tão particular em relação à violência. “Todos somos loucos”, insiste o filme, ecoando o bordão do youtuber em seu canal. Esse desvio da norma está longe de ser subversivo ou anárquico, mas atualiza a fórmula do “seja você mesmo”, propagada em muitos projetos destinados a crianças e adolescentes.

Christian Figueiredo, como comentarista de sua própria história, possui um papel redundante: ele basicamente repete o que o espectador vê nas imagens. Essa foi a concessão encontrada para introduzir a figura indispensável do jovem no filme. Abrindo e fechando a história de maneira redentora e otimista, ele surge como alguém transformado pela magia das novas tecnologias. Afinal, o culto às webcelebridades nunca deixou de ser um culto à individualidade e à personalização extrema dos veículos de comunicação. Christian propõe uma convergência eficaz das contradições de um indivíduo ao mesmo tempo normal e louco, tímido e extravagante, simples e especial.

Sem surpresa, Eu Fico Loko funciona como veículo para a reafirmação de uma marca: assim como Uma Aventura Lego reforça a compra de brinquedos e Angry Birds - O Filme divulga o jogo de celular, este projeto pretende tornar ainda mais popular a figura rentável do jovem. Não há espaço para ambiguidades ou qualquer passagem potencialmente nociva à imagem do ídolo. Este é um instrumento de sustentação, de estrutura previsível e estética inesperadamente comedida. Como conto de fadas, dialoga habilmente com os anseios da geração Y.