Críticas AdoroCinema
3,0
Legal
Churchill

Orgulho ferido

por Francisco Russo

Por mais que cinebiografias existam desde sempre, fato é que, nos últimos anos, elas têm surgido com maior frequência muito devido a uma certa "garantia de retorno", por assim dizer, junto ao público. Afinal de contas, a popularidade do homenageado automaticamente atrai o interesse, o que ajuda bastante no sempre árduo trabalho de divulgar um longa-metragem. Curiosamente, 2017 marca o lançamento de dois filmes sobre Winston Churchill, o primeiro-ministro da Inglaterra durante a Segunda Guerra Mundial que, para muitos, é considerado o maior britânico de todos os tempos. Tanto O Destino de uma Nação quanto este Churchill não abordam toda a vida do primeiro-ministro, são recortes de momentos marcantes entrelaçados pelo evento que o tornou tão consagrado: a Segunda Guerra Mundial.

Aqui, Churchill se encaminha para o desfecho do conflito, sem saber de sua proximidade. E o mais interessante não é propriamente ver o quão importante foi para a resolução do mesmo, mas justamente conferir o homem ferido por trás da imagem gravada através de seus impactantes discursos via rádio. É a partir de seus erros e da vaidade que o roteiro escrito por Alex von Tunzelmann delineia boa parte da narrativa, apresentando um homem decidido e intransigente, inteligente e rabugento, que faz o que pode para fazer valer seus ideais e sua vontade - tudo dentro de um certo limite ético e de hierarquia, como reza a cartilha britânica de polidez.

É bem verdade que Churchill, o filme, demora a revelar seu real intuito. O início a partir de metáforas visuais óbvias em meio a frases batidas sobre a quantidade de vidas desperdiçadas, tudo ao som de uma trilha sonora carregada, insinua um filme de exaltação que jamais vem. Apenas a partir dos 20 minutos, aproximadamente, quando o personagem-título é confrontado sem obter êxito, é que o filme enfim cresce. De forma bastante habilidosa, a turbulência decorrente das inquietações pessoais de Churchill se contrapõe com a certeza do espectador acerca do sucesso do Dia D, evento tão contestado pelo mesmo. A certeza do erro histórico não só retira do personagem principal o manto da infabilidade como coloca um holofote no orgulho ferido do homem, cujas ordens não são ouvidas por quem está ao redor. Neste aspecto, é importante ressaltar também a relevância da figura feminina a partir da boa presença de Miranda Richardson, que traz ainda a faceta do esposo a um personagem já tão multifacetado.

Dentro deste universo tão inquieto, o filme conta com a boa interpretação de Brian Cox como o personagem-título e ainda um punhado de coadjuvantes bem conceituados, seja pela reverência ao que Churchill significa ou pela cumplicidade tácita entre veteranos de guerra. É o que acontece, em medidas distintas, com o general Dwight Eisenhower de John Slattery e o leal Jan Smuts de Richard Durden, ambos muito bem.

Infelizmente, na reta final Churchill se rende mais uma vez às metáforas vistas no início, deixando de lado o duelo interior vivido pelo seu personagem principal. Por mais que o discurso histórico mantenha seu impacto original, quase um século após ser proferido, o contexto a partir dele é tão diluído que boa parte do interesse se perde, mais uma vez. Ainda assim, trata-se de um filme interessante por fugir da exaltação tão comum em cinebiografias, de forma a mostrar que mesmo o maior britânico de todos os tempos, gente como a gente, também errava de vez em quando.