Sobra chão, mas falta firmeza
por Barbara DemerovUma plataforma de petróleo é o palco para uma história sobre crises emocionais e do quanto relações profissionais pesam na vida pessoal. Ao adentrar neste local no meio do oceano, Paulo Sacramento dá a direção para que a catarse ocorra de forma interessante na vida de Roberto (Rodrigo Lombardi), um dos funcionários do local prestes a ser promovido. A questão é que em O Olho e a Faca as motivações não se sustentam de uma maneira crível através do personagem.
O diretor aproveita bem o ambiente marítimo e, ao mesmo tempo em que dá espaço para o espectador observar bem onde aqueles homens vivem, também entrega uma sensação de claustrofobia que se comunica com o interior de Roberto. Tal sentimento vai aumentando cada vez mais quando a narrativa se alterna entre o mar e a terra, onde Roberto vive com sua família e tem de lidar com os problemas dela - que vão se conectando com suas dúvidas e questões profissionais.
A tensão em O Olho e a Faca vai crescendo à medida em que o protagonista encara suas relações pessoais de frente: seus problemas com o filho mais velho estão cada vez mais preocupantes, sua comunicação com a esposa fica cada vez mais distante e sua proximidade com o pai ainda se encontra bem desequilibrada. Uma série de acontecimentos vão intensificando as frustrações de Roberto, mas elas não soam tão naturais quanto seus sentimentos. É curioso, pois, por mais que seja possível entender como ele se sente (graças à boa atuação de Rodrigo Lombardi), a superficialidade no modo em que tais problemas são tratados dificulta o estudo deste personagem. As ocasiões de brigas e desendimentos são restritas e de certa forma preguiçosas, pois entregam soluções clichês a fim de manter o nível de sanidade de Roberto cada vez mais baixo.
Se por um lado a narrativa funciona ao abordar o relacionamento entre os homens que trabalham na base, principalmente pelas adversidades profissionais com Wagner (Roberto Birindelli), pelo outro O Olho e a Faca não funciona quando se encontra na firmeza do chão de São Paulo. Há ainda uma participação breve e rasa de Débora Nascimento como a amante de Roberto, que além de não adicionar muita coisa à narrativa não ajuda a tornar o personagem mais compreensível. Afinal, entender a crise de um homem que possui um emprego fixo e cuja família gostaria de se manter unida fica um pouco complicado quando o vemos se esforçar muito pouco para fazer as coisas darem certo. Sua ruína é construída de forma rasa, pois não temos informações de tudo o que aconteceu até ali.
O Olho e a Faca tenta oferecer camadas mais densas em sua história, mas no final muito do seu sentido se perde. O corvo que observa Roberto simboliza uma metáfora de que maus tempos podem estar por vir, mas não vai muito além disso. Pela frivolidade, o resultado narrativo que fica registrado torna-se inferior ao que é construído pela beleza estética e a boa direção de Sacramento.
Filme visto na 42ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, em outubro de 2018.