Críticas AdoroCinema
2,0
Fraco
O Silêncio do Pântano

Ideias que não se justificam

por Barbara Demerov

Logo nas primeiras cenas de O Silêncio do Pântano, uma fã do autor Q (Pedro Alonso) o questiona porquê um de seus personagens possui o instinto de matar compulsivamente. Ela quer saber quais são as suas razões ou traumas do passado. O protagonista, então, responde que "nunca pensou nisso". Tomando este breve diálogo como base, o filme segue mais ou menos a mesma intenção do autor fictício: nunca narrar abertamente ao espectador as razões pelas quais Q é, na realidade, um assassino a sangue frio também.

Ou será que ele não é? Dirigido por Marc Vigil, o suspense protagonizado por Alonso (conhecido por interpretar Berlim na série La Casa de Papel) possui uma premissa interessante, mas que é completanente sub-utilizada ao longo da evolução da narrativa. Q é um escritor sociopata que busca inspiração para novas histórias com base em pessoas reais, mas o que há de mais intrigante em sua história vai diminuindo a partir do momento em que encontra um ex-ministro chamado Ferrán Carretero (José Ángel Egido).

Suspense traz ambiguidade sem muito fundamento

Quando Q (ou seu alter-ego dos livros?) sequestra Carretero em troca de inspiração para uma trama policial e política, outros personagens começam a surgir - incluindo o matador de aluguel Falconetti (Nacho Fresneda), cuja presença se resume a ações violentas e não a palavras. No entanto, com exceção de Q, nenhum personagem possui a mesma força ambígua do protagonista e isso acaba interferindo muito na imersão. Aliás, Alonso interpreta possivelmente as duas versões de Q: a real e a fictícia, dando uma cara ao personagem que lhe tornou tão famoso. Por isso a experiência se torna tão intrigante - mas não no sentido de construir a tensão para chegar ao clímax.

O monólogo inicial de Q, em que ele cita o pântano como um local tanto físico quanto metafórico (no sentido de que ele precisa ser devidamente "limpo"), apenas introduz uma pequena parcela do que está dentro de sua mente, mas nunca é possível desvendarmos de fato o que se passa em sua história. Apesar de a montagem ter seus méritos em manter a curiosidade do espectador aguçada - sustentando-se no fator de não sabermos se aquilo que estamos vendo é real ou não -, a profundidade introduzida na abertura de O Silêncio do Pântano não condiz com o resultado final, que é extremamente raso ao não propor a estudar seu protagonista de forma a dar mais camadas às suas motivações.

Em meio à ambiguidade explícita desde os momentos iniciais e à boa atuação de Alonso (que se esforça para se afastar dos trejeitos de Berlim), o que mais se sobressai em O Silêncio do Pântano é a técnica. Mas, tão importante quanto uma direção que convence por aproveitar bem as diversas ambientações da cidade de Valência ou uma fotografia que igualmente tira o melhor das possíveis metáforas que o roteiro propõe, é a motivação do protagonista ser forte o suficiente. Como o filme está convencido demais de a imagem já entrega o suficiente para captarmos toda a significação do que não é dito, infelizmente este não é o caso.