Ritmos da floresta
por Francisco RussoAmazônia Groove é daqueles filmes que tão bem demonstram o quanto o avanço da tecnologia por vezes contribui para a realização de um projeto, no caso, em relação ao uso de drones em sets de filmagens. É graças a eles que a belíssima sequência de abertura deste documentário foi rodada, permeando as entranhas da floresta atrás do rio Amazonas até, subitamente, encontrar uma procissão em variados barcos. Toda em plano-sequência, ela de imediato apresenta a conexão existente entre natureza e cultura, em uma simbiose que norteará todo o longa-metragem.
O esforço do diretor Bruno Murtinho em seu longa de estreia é justamente ao vasculhar o apelo do rio perante a musicalidade da região, nos mais variados aspectos, levando em consideração não só o isolamento presente em certas áreas mas, também, a própria influência da fauna local. É assim que conhecemos pai e filho, ambos músicos, que buscam o padrão sonoro do sabiá branco de forma a usá-lo em uma nova canção. Ou o búfalo-bumbá, variação típica da ilha de Marajó. Ou ainda a Gangue do Eletro, que sacode a juventude em festas realizadas a qualquer canto, cujo líder cunha o termo que dá título ao filme.
A escolha de seus personagens é um dos maiores atrativos de Amazônia Groove, não apenas pela variedade empregada dentro de sua proposta mas, especialmente, pelo carisma e personalidade dos escolhidos, proporcionando uma cativante pluralidade de ritmos e histórias de vida. Soma-se a isso uma fotografia belíssima, beirando o publicitário em certos momentos, que explora com competência de imagens panorâmicas a closes que tanto revelam sobre o ambiente em que cada entrevistado está inserido. Soma-se a isso certas pérolas espalhadas no decorrer do longa-metragem, como a explicação da cantora Gina Lobrista acerca das diferenças entre sucesso e fama - a típica sabedoria popular que vai direto à essência do tema.
Com uma ambientação tão cuidadosa e entrevistados tão ricos, o pecado de Amazônia Groove é, em certos momentos, passar a impressão de que certas cenas foram fabricadas. É o caso da pintura da casa durante uma entrevista ou mesmo do cortejo com músicos em alegria esfuziante, ambos em momentos que exalam artificialidade. O cuidado excessivo com o aspecto estético também ajuda nesta sensação, especialmente devido ao tom publicitário que a fotografia assume em determinadas cenas, até mesmo abusando da câmera lenta.
Ainda assim, Amazônia Groove é um documentário bastante interessante pelo apuro empregado na produção e também pelo elenco selecionado, numa espécie de "Buena Vista Social Club da Amazônia" que tão bem explora a potência das imagens e musicalidade, em um tom carinhoso e respeitoso que jamais dialoga com qualquer preconceito sonoro existente.