Críticas AdoroCinema
2,5
Regular
Bio - Construindo uma Vida

Através de outros olhares

por Barbara Demerov

Apostando no formato de mockumentary (falso documentário), o novo filme de Carlos Gerbase busca contar a história de uma pessoa sem precisar nos apresentá-la fisicamente. Em Bio, o espectador se dá de cara com aproximadamente 40 depoimentos de diversos personagens que tiveram algum tipo de contato com o protagonista (que vão do pai, mãe, esposa e filhos até colegas de trabalhos e amantes). Por possuir essa escolha de não entregar mais informações sobre o homem, um biólogo, que vão além dos depoimentos, é preciso lidar com a própria imaginação a partir de cada visão sobre a pessoa.

Sendo assim, Bio torna-se uma experiência interessante - além de ser experimental, pois nem mesmo o nome do protagonista é citado e o que sabemos sobre ele só tem como base as vivências de qualquer pessoa que não seja as do próprio. A opinião que pode ser formada sobre o biólogo pode ser bem relativa de espectador para espectador, mas de todo modo é inevitável que a visão subjetiva dele faça falta. Se temos todos os pontos de vista menos o dele, é difícil não pensar no que o protagonista teria a falar sobre tal situação ou pessoa. Ao mesmo tempo, o fato dele já estar morto após viver por longos 110 anos dá um tom de homenagem e saudosismo à obra, criando uma atmosfera que mantém certa curiosidade no ar.

O problema é que, por vermos tantos depoimentos através das décadas, algumas atuações soam mais fantasiosas que realistas. Há graus diferentes de intensidade expostas em tela. Por mais que a escolha de ser um documentário ficcional faça sentido por engrandecer a vida de um homem que marcou a vida de tantos (e que, de algum modo surpreendente, não sabia mentir), há diferenças cruciais nas atuações de uma parte do elenco para a outra parte, que profere suas falas de forma mais natural e verdadeira. Isso interfere no ritmo de Bio principalmente quando precisamos reconhecer a existência do protagonista sem mesmo o conhecer, ouvir sua voz. Quem nos precisa convencer disso são os personagens que conviveram com o biólogo, mas esta mensagem torna-se um tanto falsa ou forçada durante alguns depoimentos.

O ritmo também é prejudicado pela montagem, que intercala inúmeras falas diferentes em pouco tempo. Não há tempo suficiente para adentrarmos nas palavras de uma só pessoa, pois elas são misturadas com facilidade e muito rapidamente, não entregando tanta convicção. A aura onírica e imaginativa que, num primeiro momento, capta a nossa atenção, vai aos poucos diminuindo devido às nuances de cada época, que encontra seu ápice no futuro, nos anos 2070.

Bio possui elementos intrigantes (sendo o fato do protagonista não mentir o maior deles), mas não os aproveita de forma que torne a experiência algo a mais do que apenas um experimento. As informações dadas pelos atores que mais se destacam, como Marco RiccaMaitê Proença e Maria Fernanda Cândido, conseguem tornar a história um pouco mais dinâmica devido às boas atuações, mas a ausência de ação impossibilita o espectador de sentir algo com relação ao tanto que é narrado. Este é, de fato, um filme irreverente e original, mas que se perdeu no trajeto entre a construção da ideia até sua execução.