Críticas AdoroCinema
2,5
Regular
Lizzie

Retrato de uma sociedade machista

por Francisco Russo

Desde a eclosão dos movimentos #MeToo e Time's Up, várias têm sido as histórias feministas a (enfim) ganhar espaço, tanto nos filmes quanto nas séries. Entretanto, mais do que simplesmente trazer à tona narrativas protagonizadas por mulheres, é preciso também compreender tal realidade de forma a trazê-la à tona com a desenvoltura necessária. Este, no fim das contas, é o maior problema de Lizzie.

Dirigido pelo pouco conhecido Craig Macneill, o filme aborda a Inglaterra do século XIX ao retratar uma sociedade de forte cunho machista, onde às mulheres cabia a reclusão e reverência aos homens, seja ele seu marido ou pai. Esta é a vida de Lizzie Borden, que tenta ir além das imposições paternas ao tomar atitudes ousadas para a época, como ir sozinha ao teatro. Sem muito interesse em construir as várias facetas da sociedade em questão, Macneill se preocupa mais em estabelecer situações-chave onde fica escancarado o lado odioso dos homens - qualquer homem - diante da fragilidade de sua protagonista, de forma que tal dinâmica ressalte o poder da superação em um desfecho supostamente apoteótico, e bastante previsível.

Para tanto, o diretor logo escancara os truques que têm à disposição: seja a partir de uma invasiva trilha sonora em busca de um suposto suspense ou mesmo da narrativa apresentada em flashback, após uma morte chocante, Lizzie é construído de forma bastante esquemática na condução de sua personagem principal, sem muito desenvolver os coadjuvantes em torno de si - basta reparar que a irmã, que convive na mesma casa, mal é vista em cena. Mesmo o relacionamento com Bridget, e o preconceito decorrente da negação de sua identidade pela sociedade da época, é mal trabalhado dentro da narrativa. A pobreza visual do longa-metragem, seja na fotografia ou mesmo no figurino e direção de arte, também não ajudam a compôr um clima envolvente.

Diante de tais problemas, resta ao filme se sustentar na força de sua protagonista. Por mais que esteja longe de seus melhores trabalhos, Chloë Sevigny tem competência e carisma suficientes para trazer força dramática à personagem, seja nos momentos de aflição ou mesmo de decisão. O mesmo já não pode ser dito em relação a Kristen Stewart, mais uma vez apática em uma personagem bastante superficial.

Como retrato de uma época e reflexo das mudanças decorrentes às mulheres desde então, Lizzie até tem seu valor. Infelizmente, pelas condições técnicas e a forma como a narrativa é conduzida, soa mais como uma tentativa de se aproveitar de um momento propício em relação a filmes feministas do que propriamente em abordar e analisar a questão com alguma profundidade.