Críticas AdoroCinema
3,0
Legal
Campo Grande

A ascensão infantil

por Renato Hermsdorff

O cinema brasileiro, na condição de indústria, está a anos-luz de Hollywood, afinal, faz apenas 20 anos desde que iniciamos a Retomada da nossa produção (com Carlota Joaquina, Princesa do Brasil e Terra Estrangeira, em 1995). A consequência desse processo, lento, é que, embora tenhamos avançado em alguns aspectos “macro” da cadeia (direção, roteiro, fotografia), no detalhe, certos elementos deixam a desejar em termos de qualidade artística, sendo um deles, a dificuldade de se encontrar bons atores mirins. Essa é a (sabida) má notícia.

Quantas produções, mesmo de grande porte, não foram lançadas nesse período, que trazem crianças prodígio (no mau sentido) e/ou robotizadas? Felizmente, esse não é o caso de Campo Grande, filme de Sandra Kogut, para o qual a interpretação infantil é de suma importância para a trama. Essa é a boa nova.

No longa-metragem, Carla Ribas é Regina, uma típica mulher da classe média da Zona Sul do Rio de Janeiro, bairro nobre da cidade. A excelente atriz de A Casa de Alice (2007) já tinha dado provas de sua habilidade na profissão e conduz com sutileza (nem condescendente, nem megera) seu papel aqui.

Mas a novidade, em Campo Grande, vem “de baixo”. Rayane do Amaral, da altura de seus cinco anos, e Ygor Manoel, que dá vida ao irmão (um pouco) mais velho, são o grande destaque do novo filme da diretora de Mutum.

Rayane e Ygor (esses são também os nomes dos personagens) são deixados na porta do apartamento de Regina sem nenhuma explicação imediata. A única pista que a menina dá do mistério é que a sua mãe a largou lá, prometendo buscá-la “na volta” (não se sabe de onde, nem quanto tempo vai demorar, nem sequer se vai mesmo retornar).  

Sem saber o que fazer, Regina pensa em levá-los ao orfanato, mas é convencida pela filha adolescente (Julia Bernat) de deixá-los passar a noite. Decidida a ajudá-los a encontrar sua família, a jovem senhora, orientada por Ygor, vai parar na Campo Grande (Zona Oeste da cidade) do título.

Trata-se de um filme pequeno (independente, não-comercial, de baixo orçamento?), que conta com o trabalho da preparadora de elenco Fátima Toledo, requisitada pelas superproduções nacionais (Cidade de Deus, Tropa de Elite, Assalto ao Banco Central), mas que também tem trabalhado cada vez mais em produções menores (independentes, não-comerciais, de baixo orçamento?), como o já citado Mutum, Ausência, Boi Neon.

A transição da profissional – de métodos considerados “polêmicos”, mas de resultados inquestionavelmente eficazes – entre filmes de perfis (leia custos) diferentes é, por si só, um indício desse novo caminho profissionalizante da indústria nacional (não que ela não tenha trabalhado em filmes “mais baratos” antes, sobretudo no início da carreira).

Mas a história, em si, é simples – até demais. A busca pela mãe das crianças lembra a procura do pai de Central do Brasil, mas sem o apelo visual do filme de Walter Salles, nem o envolvimento emocional do longa de 1998. A duração das cenas de Campo Grande, o tempo da ação, não contribuem muito em termos dramatúrgicos para a obra, resultando em uma narrativa arrastada e, muitas vezes, sem propósito.

Filme visto no 40º Festival Internacional de Cinema de Toronto, em setembro de 2015.