Críticas AdoroCinema
2,0
Fraco
Eu Nunca

Meia experiência

por Bruno Carmelo

Os primos Thiago e Guilherme estão se preparando para ir ao velório do avô, mas decidem fugir ao compromisso entediante e passar o fim de semana no sítio da família. Eles levam a amiga Priscila junto. Isolados neste local, começam os jogos possíveis: E se nós três fizéssemos sexo juntos? E se contássemos nossos segredos? E se a gente desse um tiro de espingarda naquele homem ali no horizonte? Por que não?

O início sugere que as ações dos personagens estão pautadas pela dor do luto, mas é difícil perceber qualquer transtorno nas atuações de Kauê Telloli e Francisco Miguez. O que se percebe neste curto filme (72 minutos) é uma sensação de inconsequência, de superpotência: eles têm à disposição uma casa grande, carro com gasolina, dinheiro, bebidas, uma espingarda carregada. Com esse arsenal, os dois garotos imediatamente disputam a garota (Samya Pascotto), registrando a briga para atestar o vencedor mais tarde. Para isso, é claro, existe uma câmera amadora sempre ligada.

O subgênero do found footage (a filmagem supostamente feita por amadores, e encontrada mais tarde) sempre enfrentou problemas de lógica, e Eu Nunca escancara essas limitações. O diretor Kauê Telloli nem sempre consegue justificar a presença da câmera, em especial rumo à conclusão, quando o drama se transforma em suspense. Os planos compostos também destoam da aparência amadora, assim como as elipses temporais cuidadosas demais para um material supostamente desprovido de edição.

O filme está mais interessado em criar tensão sexual do que tensão narrativa: poucos conflitos são criados nas brincadeiras do trio, o que pode tornar a experiência um tanto monótona para o espectador. Para uma produção obcecada por sexo e morte – afinal, a primeira cena traz uma masturbação às vésperas de um velório – é surpreendente que não se mostre um beijo sequer, uma única gota de sangue. O enquadramento não se aproxima dos corpos, os personagens não mantêm contato além das palavras e das sugestões. Esta escolha é irônica: enquanto o found footage é um gênero destinado a mostrar tudo, pela representação do tempo real, Kauê Telloli tenta esconder o máximo possível. Quando finalmente o sexo e a morte entram em jogo, estes elementos são deixados fora de quadro ou ocultados pela montagem.

Tamanho pudor ou mesmo conservadorismo (vide o tratamento machista reservado às mulheres) é a marca de Eu Nunca, produção que decepciona por não explorar seu potencial imagético e diegético. O estilo amador é pertinente ao baixo orçamento, mas a mesma liberdade comercial e de produção permitiria maior experimentação de linguagem. Este se tornou um “filme quase”: ele é um suspense sem tensão, uma promessa erótica sem sexo, o anúncio de uma surpresa que nunca se concretiza. Eu Nunca é um filme repleto de pulsões, mas contido demais nas escolhas estéticas e no desenvolvimento dos personagens.