Críticas AdoroCinema
2,5
Regular
Quatro Vidas de um Cachorro

O melhor amigo das lágrimas

por Taiani Mendes

"Qual é o sentido da vida?", pergunta-se o cãozinho na primeira fala ouvida em Quatro Vidas de um Cachorro. Ele não sabe o da dele, eu não sei o da minha, mas suspeito que a razão da existência do diretor Lasse Hallström seja inundar salas de cinema com lágrimas. Passados oito anos do desidratante Sempre ao Seu Lado, o sueco volta a usar um cachorro como protagonista e isca para choro livre. Baseado no homônimo best-seller de W. Bruce CameronA Dog's Purpose (título original) é estrelado por um cão inquieto sobre o seu existir. Conforme o título indica, ele morre e reencarna várias vezes em busca de respostas e do reencontro com seu dono mais querido, Ethan, primeira pessoa a amá-lo.

O menino entra em cena na segunda vida do cachorro, em 1961, o batiza de Bailey e é realmente o melhor companheiro que ele poderia sonhar. Cheio de energia, carinhoso, cúmplice e paciente, Ethan tem sua imagem boa construída com tanto esmero que chega até a roubar o protagonismo durante algum tempo - o que não chega a ser ruim para a história. Bryce Gheisar, que interpreta o garoto, é puro carisma e fofura, e o adolescente K.J. Apa mantém as características quando ocorre a passagem de tempo. Já Dennis Quaid, maior nome do elenco, acaba sendo a grande decepção por adotar o método Will Smith de atuação e acreditar que boca bem fechada e cabeça torta significam "homem embrutecido pelas dores da vida".

Por conta de sua importância, a relação Bailey/Ethan domina a maior parte do filme, mas existem ainda outras vidas: a intensa e a divertida. A terceira, em que Bailey é Ellie, cachorra policial, é a mais problématica e espremida, marcada por falhas de verossimilhança - que estão por toda parte, mas aqui são mais evidentes. É fato que o forte do roteiro é a parceria de Bailey com Ethan, não sua personalidade individual, e as sequências com os outros donos acabam comprovando isso, apesar das gracinhas caninas que jamais deixam de funcionar.

Narrada com inocência e leveza pelo cachorro, que na versão legendada tem a voz um tanto quanto infantil de Josh Gad (o Olaf de Frozen - Uma Aventura Congelante), a produção começa tentando "ser" o cão, com uso e abuso da câmera subjetiva. À primeira vista a opção é divertida, adotada à exaustão, incomoda, e antes do meio da trama é praticamente abandonada. Seria muito estranho um filme inteiro do ponto de vista do animal de quatro patas? Sim. Mas é igualmente esquisito - talvez até mais - iniciar assim e depois abandonar completamente a proposta. Dito isso, Hallström continua com seu estilo feijão com arroz que funciona. Ele filma bem, sabe contar histórias familiares e tem talento para fazer chorar. Sempre consegue. Na comparação com Sempre ao Seu Lado, Quatro Vidas de um Cachorro sai como inferior pela irregularidade da narrativa e incongruências do personagem principal, mas tem a vantagem de não buscar tão desesperada e escancaradamente as lágrimas dos espectadores.

Apostando na teoricamente infalível fórmula de sucesso "espiritismo + animal de estimação fofo", Quatro Vidas de um Cachorro emociona e é capaz de divertir moderadamente, mesmo com toda a previsibilidade de sua história. O problema são as acusações de maus tratos animais que caíram como uma bomba pouco antes da estreia e transformaram o longa no famoso "filme do cachorro que apanhou". Pode ser difícil seguir a recomendação de "aproveitar cada momento" quando lembramos que um cão foi submetido a tanto sofrimento para aparentar estar se divertindo. Certamente não era esse o seu propósito.