Em busca da aprovação interna
por Barbara DemerovDumplin é um filme de muitas camadas. Por questões óbvias, a que mais atrai num primeiro momento é a do concurso de beleza em uma pequena cidade do Texas, que une as mulheres da região em prol do reconhecimento de que elas estão aptas a fazer o esperado: encantar. Mas há muito mais por trás dos palcos deste pequeno espetáculo. Felizmente, aqui não vemos uma história de luta e conquista relacionada à chance de ser exatamente o que a sociedade almeja. Esta não é a história de uma jovem que busca a aprovação do júri para saber quem é: Willowdean "Dumplin'" Dickson (Danielle Macdonald) já tem uma leve noção disso, mas só precisa de um empurrãozinho para ter certeza.
Entrando no time de produções originais Netflix cuja aproximação é pensada justamente no público jovem - como Para Todos os Garotos que já Amei e Sierra Burges é uma Loser -, Dumplin é o longa mais maduro e completo desta lista, especialmente no que se diz respeito a possuir um olhar gracioso e realmente aproximado com a realidade. O discurso delicado contido dentro da questão de se encaixar aos olhos da sociedade (particularmente as mulheres) é a base da história, e este é feito de maneira convincente e bem distribuída. Canções clássicas de Dolly Parton intercalam-se com as inseguranças e reflexões de Willowdean, assim como seus momentos de solidão se encontram com os de coragem súbita.
Tal coragem é acionada pela saudade que tem da tia, já falecida, que lhe criou mais do que sua própria mãe, Rosie (Jennifer Aniston). A segurança e os intermináveis conselhos da tia formaram o legado que Will recebeu - e que agora tenta colocá-lo em prática. Ao desafiar a mãe (uma famosa ex-miss) com a inscrição no famoso concurso de beleza, a protagonista não tem como foco a vontade de ganhar a tão cobiçada faixa. O que ela precisa é garantir sua autoconfiança e também encontrar algum modo para que a mãe a enxergue do jeito que é de fato, e não como um reflexo do que acha que deveria ser.
O filme não hesita em deixar clara a mensagem de que o concurso e a firme raiz que ele possui naquela sociedade continuará mesmo após a participação de Will e suas amigas, também consideradas estranhas demais para entrar em um evento do tipo. O concurso é apenas o momento perfeito para que todas se afirmem e, de bônus, tenham a chance de fazer com que a maioria dos moradores da região, tão conservadores e superficiais, registrem isso também. Desta forma, Dumplin é um reflexo do molde imposto ao longo dos séculos a fim de fazer com que as mulheres busquem a aprovação externa para se sentirem completas e felizes - e a cereja do bolo é que o filme não entrega, nem de longe, esta "solução".
Sob a ótica de Will, a vitória que almeja não é a certificação de que ela é como todas as outras moças, mas ao mesmo tempo ela também passa a entender que está tudo bem ser bonita, contanto que esteja feliz e satisfeita consigo mesma. A amizade que possui com Ellen (Odeya Rush) traduz bem esta diferença entre "dois mundos", mas nunca chega a vilanizar um lado para tornar o outro mais correto ou mais sincero. Está tudo bem ter cabelo curto, não ser tão magra ou usar as roupas que quiser, assim como também está tudo bem você querer participar de um concurso de beleza e se esforçar para isso.
Dumplin não teima em ser um filme protagonizado por rebeldes que querem mudar o mundo. A vontade de organizar um verdadeiro motim ao evento da cidade aos poucos vai se transformando na chance de todas as personagens encontrarem seu lugar e terem a chance de brilhar - e, com isso, também há espaço para Rosie ganhar uma nova visão sobre si mesma e sobre sua filha. As ótimas atuações de Aniston e Macdonald transparecem todas as nuances de um relacionamento fraternal que acaba se provando muito mais forte do que se imaginava.
O concurso de beleza se torna um concurso de talentos, assim como o filme se torna uma história de autoconhecimento - e não sobre a busca do encaixe perfeito. A mudança pode até começar pequena, mas Dumplin com certeza traz uma ótima sensação de igualdade e respeito. E, para isso, ninguém precisa se perder de sua própria essência ou mudar seus moldes.