Retrato da juventude
por Bruno CarmeloA sinopse oficial deste filme vietnamita indica que um adolescente tímido e apaixonado por fotografia descobre os prazeres da vida noturna através do contato com outro garoto, mais extrovertido e malicioso. Apesar da atração física entre eles, o pai do garoto decide encontrar uma esposa para o filho. Estes elementos estão de fato presentes em Big Father, Small Father and Other Stories, mas de maneira tão sutil que se desenvolvem em uma escala quase microscópica.
Dang Di Phan tem uma maneira única para contar a sua história: as cenas são apresentadas de maneira clara, os planos são ágeis, mas o cineasta retira da narrativa a noção de antes de depois, de causa e consequência. Para anunciar que uma personagem está grávida, a garota simplesmente aparece fazendo um ultrassom na barriga, sem que qualquer outra informação a respeito tenha sido mencionada antes. Quando se revela que um personagem é homossexual, ele aparece acariciando o corpo de outro homem, para a surpresa do público. Na cena seguinte, já não se fala mais no assunto.
O ritmo relativamente fragmentado cria uma atmosfera de sonho, de algo suspenso entre o real e a ficção. O filme consegue criar um tom doce e carinhoso com os seus personagens, deixando que se expressem através de outras artes como a fotografia, a música, a dança. Enquanto isso, os jovens transitam entre o meio rural e a cidade, o dia e a noite, com um simples corte da montagem. O cineasta une os tempos e os espaços, criando uma narrativa fluida.
Entre os diversos retratos que o cinema faz sobre a adolescência e as suas primeiras experiências, raros filmes conseguem ser tão delicados quanto Big Father, Small Father and Other Stories. O adjetivo “delicado” já foi empregado várias vezes de maneira pejorativa para se referir à cultura oriental, mas neste caso, o termo procede pelo carinho no retrato dos personagens, pelo tempo oferecido para interagirem uns com os outros. É impressionante como o ritmo consegue ser preciso, agradável, sem se arrastar nem acelerar o processo de cada cena.
As imagens de Dang Di Phan são um espetáculo à parte. O diretor não se impõe às cenas, fazendo grandes movimentos de câmera, ou usando fotografia preciosista. O trabalho com a luz natural é admirável, assim como a composição dos planos, onde sempre existe algo acontecendo no fundo dos planos, enquanto a ação em primeiro plano se concentra em aspectos banais (personagens cantando, dançando, observando o horizonte). Os jovens são vistos através das batentes das portas e das janelas, mas sem se esconder, como se a câmera estivesse de certo modo pedindo permissão para observar aquelas cenas de perto, em cumplicidade com os jovens. Cenas como o sexo na lama ou a embriaguez do protagonista são de uma beleza excepcional.
Às vezes, quando se assiste a um filme de que se gosta muito, é difícil explicar todas as suas qualidades. Big Father, Small Father and Other Stories oferece uma narrativa humanista e poética, um cinema inteligente e atento aos conflitos relativos à identidade, à sexualidade, à família e à religião. Mesmo com todos os elementos, consegue ser um filme de uma simplicidade comovente.
Filme visto no 65º festival de Berlim, em fevereiro de 2015.