Desastre
por Francisco RussoÉ difícil entender o porquê de Kevin Spacey, com duas estatuetas do Oscar na estante e o prestígio em alta graças ao sucesso da série House of Cards, tenha aceitado estrelar Virei um Gato. Mesmo que seja compreensível sua vontade em fazer algo mais leve, até mesmo voltado para o público infantil, o roteiro e a produção deste longa-metragem são tão canhestros que, no fim das contas, sua mera presença serve mais para denegrir o currículo do que qualquer outra coisa.
A história, por si só, é absolutamente clichê - e, por incrível que pareça, passou pelas mãos de cinco roteiristas! Tom Brand (Spacey) é um empresário todo poderoso, que curte esportes radicais e tem uma verdadeira obsessão em construir o maior arranha-céu da América do Norte. Tamanha dedicação ao trabalho faz com que ele deixe de lado sua própria família, em especial a filhota que sonha em ter um gatinho. Brand, que odeia o animal, busca escapar do pedido de todas as formas, mas acaba se rendendo ao desejo e vai parar na loja de um encantador de gatos, Felix Perkins (Christopher Walken, em mais um personagem estranho). Com o bichano em mãos, ele desvia do caminho para casa e vai parar no alto do tal prédio em construção. Ao despencar lá de cima, sua consciência repentinamente é transferida para o próprio gato.
Por mais que a presença do fantástico na transposição de Brand para o Sr. Bola de Pêlos seja algo corriqueiro em filmes envolvendo trocas de corpos, aqui chama a atenção a enorme displicência em torno do ocorrido. Não há qualquer explicação, por mais pífia que seja, nem mesmo se valendo da óbvia intenção de ensinar alguma lição ao empresário egoísta. Este, por sinal, é mais um ponto negativo do filme. O personagem de Spacey é o estereótipo do capitalista malvado, uma espécie de "novo Ebenezer Scrooge", movido pelo anseio em ser eternizado como "o maior de todos" - daí a obsessão com o arranha-céu. Sua via-crúcis na pele do bichano é muito mais na base das reclamações pela situação vivida do que de reais problemas enfrentados, assim como o tal "aprendizado" no fim das contas pouco modifica o próprio Brand. A frase final do longa-metragem é o melhor exemplo desta "não-transformação", o que dá ao filme como um todo uma sensação ainda maior de gratuidade.
Entretanto, o maior problema de Virei um Gato é realmente técnico. Os efeitos especiais usados para recriar os movimentos "humanos" do Senhor Bola de Pêlos são pífios e extremamente mal feitos, o que é um sério complicador para um longa-metragem em que 70% de suas cenas possuem efeitos especiais. Além disto, é espantoso que um diretor como Barry Sonnenfeld, habituado com a comédia nas séries Homens de Preto e A Família Addams, demonstre absoluta falta de timing na condução da história. Várias são as sequências sem ritmo, alongadas demais, o que também atrapalha muito a narrativa.
Com várias historietas que vêm e vão de forma brusca, Virei um Gato é uma imensa colcha de retalhos que atira para vários lados sem acertar em qualquer um deles. Para completar, ainda traz um elenco que varia entre o canastrão (Robbie Amell) e o piloto automático (Spacey, Walken e Jennifer Garner). Péssimo filme, um dos piores lançados em 2016 nos cinemas brasileiros.