A solenidade do poder
por Bruno CarmeloOs créditos deste filme nacional desfilam ao som de música clássica assustadora, enquanto paisagens de grandes planícies europeias desfilam em tela. Chegamos à imagem de um castelo sombrio, quando aparece o título. Pelo início, podemos ter a impressão de que esta adaptação de Macbeth se passa efetivamente no início do século XI, com brigas entre famílias distintas e duelo pelo reinado durante a guerra. Mas logo percebemos que A Floresta que se Move transcorre nos tempos atuais, mais especificamente, no mundo empresarial.
Temos apenas quatro grandes personagens em cena, definidos por suas hierarquias: um deles é o presidente de um banco (Nelson Xavier), o outro é o vice-presidente (Gabriel Braga Nunes), e seu amigo de infância trabalha como diretor financeiro (Ângelo Antônio). A esposa do vice-presidente, Clara (Ana Paula Arósio) fica submissa ao trabalho do marido. Assim como na peça clássica, o protagonista escuta uma profecia sobre sua ascensão profissional, o casal ambicioso arquiteta o assassinato de seu superior, mas depois sofre com as consequências do próprio ato.
O diretor Vinícius Coimbra tem razão ao afirmar que o texto original mantém-se atual, e portanto pode ser trazido aos nossos tempos. No entanto, sua adaptação sofre com problemas de tom e de roteiro. No que diz respeito ao tom, A Floresta que se Move faz o possível para ser o mais solene possível: a trilha sonora sublinha cada decisão maligna, a fotografia transforma um casarão contemporâneo em uma espécie de casa mal assombrada, os enquadramentos apresentam a sala do diretor, na empresa, como uma masmorra escura.
Além disso, as atuações são expressivas demais: a nova Lady Macbeth fica com os olhos avermelhados e a voz grave sempre que aparece em cena, o Macbeth moderno deixa o transtorno tão estampado no rosto que jamais conseguiria escondê-lo de quem quer que seja. A obviedade da direção faz com que o texto perca a sua ambiguidade moral: estamos diante de mocinhos e vilões clássicos, desconectados da contemporaneidade. A linguagem cinematográfica, neste contexto, serve menos para criar uma sugestão e reflexão na cabeça do espectador do que para ilustrar uma ideia, de maneira evidente e inequívoca.
Do mesmo modo, o roteiro preserva os diálogos mais pomposos, que soam bastante artificiais no contexto realista. Os personagens debatem sobre a “soberba”, a “luta pelo poder”, a “honra”. O elenco faz o que pode, e nesse sentido, Nelson Xavier e Ângelo Antônio conseguem trazer alguma naturalidade às suas falas. Mas cenas reproduzidas de Shakespeare, como a aparição do fantasma no jantar e a mancha de sangue invisível nas mãos, levaram a plateia aos risos, por serem excessivamente autoimportantes e literais.
Quando Coimbra se aventura pela fantasia (o sangue no teto, as formigas no escritório), o filme finalmente encontra a originalidade que lhe faltava. Talvez a adaptação de A Floresta que se Move fosse mais relevante se o roteiro tentasse encontrar equivalências, metáforas condizentes com os nossos dias, ao invés de reproduzir passagens da peça. Afinal, o elemento mais importante do texto original é a complexa relação do poder, e não o peso de suas reviravoltas. Do mesmo modo, o filme ganharia ressonância se tivesse mais calma, se apostasse na sutileza e na lenta progressão do suspense, ao invés de sustentar 100 minutos de clímax. Quando tudo é intenso, sobrecarregado, nada se destaca. Atinge-se a monotonia.
Filme visto no Festival do Rio, em outubro de 2015.