A Argentina num terraço
por Bruno CarmeloO diretor Gustavo Taretto tem feito escolhas curiosas no cinema: além de criar longas-metragens a partir de seus próprios curtas, ele sente-se motivado por restrições autoimpostas. Em Medianeras - Buenos Aires na Era do Amor Virtual, tinha o desafio improvável de fazer uma comédia romântica na qual os protagonistas se encontrassem apenas na cena final. A missão foi cumprida. Em Las Insoladas, Taretto buscou criar um filme sobre a Argentina sem jamais sair do terraço de um prédio. Tarefa cumprida mais uma vez.
O filme mostra seis amigas ao longo de um único dia, tomando sol no topo de um prédio de Buenos Aires, na véspera de Ano Novo. Elas se conheceram na escola de dança, e devem fazer uma apresentação de salsa dentro de algumas horas. Preso a um único lugar, o diretor e roteirista apoia o filme nos diálogos, criando uma obra um tanto verborrágica. Fala-se do começo ao fim, algo incômodo, mas atenuado pelo bom humor e pelos embates bem construídos entre as mulheres.
Por mais que Taretto tente deslocar as suas personagens e criar ritmo – entre o chão de cimento e a piscina de armar, entre o outdoor e as colunas – Las Insoladas torna-se monótono em alguns momentos. A estrutura teatral é tão inusitada quanto repetitiva. Pelo menos, ao longo da narrativa, os diálogos melhoram e a personalidade das seis amigas se desenvolve de modo aprofundado. É interessante que Taretto coloque frente a frente uma sonhadora e uma realista, uma mística e uma cética, uma maliciosa e uma ingênua. A escolha pode ser didática, mas funciona no propósito reflexivo do conjunto.
De fato, os temas abordados justificam o investimento do diretor no projeto. Todas as questões urbanas da década de 90 são representadas ao longo da trama: as dificuldades financeiras na era da paridade forçada entre o peso e o dólar, a opressão feminina, a claustrofobia da metrópole e o fetichismo da alteridade – representado por Cuba, com ótimas piadas sobre a desinformação do Ocidente sobre o comunismo. O roteiro toca em dezenas de questões importantes, sem reduzir suas mulheres a objetos de desejo ou a figuras amorosas. Aliás, fala-se pouco sobre amor ou aparência, algo louvável em um filme com mulheres em papéis principais.
Se fosse um pouco mais longe em seus complexos temas, Las Insoladas seria uma obra realmente questionadora e ousada. Mas Taretto mantém as rédeas firmes no terreno do feel good movie, interrompendo a discussão cada vez que se torna séria demais. Nesses momentos, as palavras se silenciam, a imagem busca o colorido dos biquínis, a trilha de salsa cresce e ocupa o espaço sonoro (em volume ensurdecedor, diga-se de passagem) e a indicação da temperatura na tela ressalta que estamos, de fato, em um filme de verão sobre amigas se bronzeando juntas. O cineasta tenta navegar entre o terreno comercial e o circuito de arte, entre a diversão e a política. Conquista resultados razoáveis nos dois terrenos, sem investir a fundo nem em um, nem em outro.