Críticas AdoroCinema
4,0
Muito bom
O Novato

Os meus amigos são um barato

por Taiani Mendes

Benoit é um unicórnio. Benoit é um menino, mas é como um unicórnio. Se mudou recentemente, é novo na escola e não tem amigos. Tímido, doce, simpático, belo e solitário, ele não é estranho o bastante para andar com os alvos fáceis de bullying e tampouco cool o suficiente ao ponto de receber autorização para se aproximar dos populares. É um tipo único. Parece lenda, poderia ser invisível, mas existe. A mãe o pressiona a fazer colegas, o irmão caçula o humilha enumerando seus contatos e Benoit, diminuído pela impopularidade, cede ao microcosmo de sua sala de jantar e se empenha em tentar reverter o quadro da maneira que for. Pela barriga, com chocolate grátis, ele é solenemente ignorado. A atenção só vem quando, num ato desmedido, briga com o menino estranho que senta ao seu lado. Sua “atitude” chama atenção de Charles, o popular, e Benoit, inebriado pela oportunidade, abre as portas de sua casa para o rapaz, que, como um vampiro, suga sua energia, age como se fosse o dono do local e sai sem pedir licença. Abandonado e usado, o esforçado Benoit encara a crueldade infantil no dia seguinte, quando descobre ser alvo de chacota da turma por conta da decoração de seu quarto. É impossível fazer amigos, ele se dá conta.

O Novato, deliciosa comédia francesa dirigida por Rudi Rosenberg, oferece 80 minutos de imersão no intenso, imprevisível e sempre complicado ambiente escolar, origem dos amigos duradouros, dos primeiros amores, das brigas e das melhores histórias que ficam para toda a vida. Estreando em longa-metragem, o diretor assume a opção ousada de eliminar quase totalmente os adultos do filme e esse acaba sendo o seu diferencial e uma de suas maiores forças. Livres de mães, pais e professores, os quase adolescentes interagem apenas com o tio de Benoit, Greg (Max Boublil), um ex-DJ que mal sai do sofá e diz querer ver “sangue na parede e todas as crianças bêbadas” durante a sensacional festa organizada pelo sobrinho - portanto, longe de poder ser considerado um responsável. Do mesmo nível de maturidade que os meninos, ele os trata de igual para igual e em aparições pontuais se revela um dos melhores personagens da trama, que pelo humor, cenário e afinado elenco jovem faz lembrar remotamente outra joia recente do cinema para todas as idades francês: O Pequeno Nicolau.

Trama original de Rosenberg, O Novato tem como base firme o carismático - e novato - Réphaël Ghrenassia. Na pele de Benoit ele transmite com propriedade todas as mudanças de postura do garoto, que não são poucas, e o seu carrossel de emoções. Ele é legal e bem intencionado, mas às vezes se acha melhor que os demais, tem seus momentos de vacilação, erra antes de aprender e tudo isso é representado de forma impecável. Mas ele não está só. Brilham no apoio Joshua Raccah (o excêntrico Joshua, que não tira a blusa de Porto Rico), Géraldine Martineau (Aglaé), Guillaume Cloud Roussel (Constantin), Johanna Lindstedt (Johanna) e Eytan Chiche (Charles).

Sejamos sinceros, o que importa realmente em boa parte do ensino fundamental são as relações. Adepto dessa ideia, o filme não se prende a professores, matérias, provas e sim a coisas como bilhetes repassados, festinhas, quem senta ao lado de quem no lanche, visita à enfermaria e votação de representante de classe. Ninguém se preocupa com dever de casa e pouco importam as notas. Benoit tem à sua frente o enorme desafio de encontrar amigos para todas as horas e de quebra descobre para que serve o coração. O que permanece não passa pelo quadro negro – ou branco  – e na verdade mal pode ser transmitido, apenas vivido. O Novato mostra sentimentos sem cair no sentimentalismo e consegue abraçar variados temas enquanto acompanha um personagem bastante confuso sobre suas prioridades. Há amor, há graça e há frescor. Entretenimento para todos os públicos.