Quem tem irmão(ã), vai entender
por Renato HermsdorffFrancis E. Francis é um garotinho que não tem do que reclamar. Filho de pais trabalhadores – e, ainda assim, dedicados, ao contrário da expectativa –, ele vive um mundo de fantasia, comum à idade, cercado do carinho e atenção do casal que o trouxe à vida. Até que... O conflito central de O Poderoso Chefinho se dá quando o rapazinho ganha um irmão, um bebê que – comum à pouca idade – chega para sequestrar a atenção dos pais de Francis, que, naturalmente, fica enciumado.
Incomum, no entanto, “Bebê” não é qualquer recém-nascido. E é aí que entra a “magia” do cinema. Ele usa terno (!), carrega uma maleta (!!), chega de táxi (!!!) e, na surdina, age como se tivesse um grande plano escondido na fralda (!!!!) A sequência de abertura, que explora a ideia “de onde veem os bebês”, mostra que nem todo infante sobe (ou desce, vai saber...) à Terra com o intuito de espalhar fofura – e, exatamente por contrariar essa máxima, é simplesmente hilária.
Recheado de referências pop – que vão de Mary Poppins a O Senhor dos Anéis, passando pela cozinheira Julia Child, que já foi interpretada nos cinemas por Meryl Streep –, The Boss Baby (no original) deve agradar aos pais. Por outro lado, simplesmente tentar explicar o enredo do filme não é brincadeira de criança. A história rocambolesca pode deixar os menores perdidos, a despeito do visual colorido atraente (comum às animações dos grandes estúdios).
O fato é que (vamos tentar) Bebê é encaminhado para servir ao time de uma corporação que tem como objetivo evitar que os bebês deixem de ser “produzidos”. Tipos como ele identificaram uma ameaça, um potencial concorrente na briga pela atenção dos adultos que poria fim à linhagem humana. Se for malsucedido em sua missão, ele corre o risco de se tornar um bebê... comum – tudo que o irmão mais velho não quer e, por isso, os dois unem forças.
Submeter a audiência a uma narrativa truncada demais – por mais que a opção seja justificada no fim – é um risco que o filme assume. Se a produção cai no enfado depois de um tempo de projeção – e cai mesmo –, por outro, o roteiro de Michael McCullers (da franquia Austin Powers) explica o porquê de tanta confusão.
E esse é o grande barato do filme do diretor Tom McGrath (Madagascar). O que O Poderoso Chefinho faz é abordar a metáfora do conturbado (e competitivo) relacionamento entre irmãos de forma criativa, ressignificando a relação fraternal num ambiente corporativista. Quem tem irmão(ã), vai entender. (E que não tem, tem memórias de infância).